sexta-feira, 30 de abril de 2010

Manoel considera a barbárie social contida

Frederico Mendonça de Oliveira

“Ó Maria, vou até o centro com o confrade Fox, que ele tem uma rescisão na delegacia do Ministério do Trabalho. Queres que eu traga algo daqueles meandros?”, pergunta Manoel para sua amada, atracada já de manhãzinha com os afazeres, próxima por sua vibração sempre receptiva para seu Manoel; distante, porque concentrada de todo na condução do dia no lar. “Se quiseres alguma besteirinha para ti, para incrementar o almoço, compre. Para mim, nada.”, responde ela. Beijando sua perfumosa mulher, Manoel sai para o cenário da bestialidade conflagrada, que já se desenrola a céu aberto no arraial. O amigo Fox já vinha passando para subirem de ônibus – ambos rejeitam radical e conscientemente o automóvel, um dos ingredientes mais ativos na manifestação da decomposição urbana e humana –, e já percorrem em franco diálogo o quarteirão até o ponto do businho. O assunto logo se engata: o amigo Fox, recentemente dispensado de seu emprego, um serviço que não conseguia prestar há anos por boicote de bugres locais invejosos e degenerados, está indo enfrentar o acerto rescisório na delegacia do Ministério do Trabalho e Emprego, mais um ambiente kafkiano petista a suportar. O busildes chega, eles embarcam, meia dúzia de fuças os fitam bestamente. Olhares vacuns, vazios de teor ou conceitos, olhares de zumbis, de objetos sociais vestidos. A conversa entre Manoel e Fox prossegue, agora pespontada por episódios de constatação de ambos diante do quadro “humano” que os cerca. Enter.
“Ah, as novas mulheres jovens, mães de classe média!...”, desabafa Manoel com seu amigo, ambos considerando umas dondocas empetecadas de malhas de cores contrastantes e berrantes deambulando a esmo pela rua. Andam assim, de tênis de marca, cabelos com reflexo, carros do ano, crianças estupidificadas a tiracolo, miniaturas refletindo quem elas são. Roupas apertadas, de ginástica, buscando sensualidade mas despencando no brega, todas parecem umas réplicas de anamariabragas. Os filhos a tiracolo, ansiosos, perdidões, parecem mesmo lourojosés. Dentro das mentes delas, desejos. Produtos de consumo, desde o shampoo até o desodorante de pés. Vestimentas e calçados, só os apregoados como top da indústria das aparências e do conforto. Os panos, coisas impensáveis, indicativos de vazio mental. Malhas esportivas, calças de lycra, relógios espalhafatosos e normalmente ridículos, jóias. E os lourojosés, projetos de consumidores obtusos e renunciantes da própria existência por injunção do Sistema, condenados ao Português do “vô vim”, do “nóis vai”, do “trais pra eu”, do “daqui dez dias” e à busca estúpida e inútil da satisfação material imediata, esses são os “homens de amanhã”... “Homens de amanhã?? Estes são os homens da pré-história da Humanidade!”, comenta Manoel com Fox, que com ele contempla os “seres” que formigam tolamente pela superfície deste arraial, superfície que mais se assemelha a profundezas... e a dupla vai subindo o morro aboletada no coletivo e sacando tudo à volta. Enter.
E lá vemos os dois diante da delegacia do “Ministério do Trabalho e Emprego”. Fantástico!: está fechada a corrente e cadeado, e na varanda está afixado um cartaz informando estarem os funcionários da instituição em greve por tempo indeterminado, e o cartaz ainda expressa um conceito justificando a greve como “para melhorar” atendimento ou eficiência. Uma cascata lá, um agá. Manoel e Fox trocam um olhar de ficha caída na cuca, e a pergunta lá vem: “E essa, agora??”, e logo Fox liga de celular pro advogado, que o aconselha a ligar pro empregador. E lá vai a sucessão de passos atrás do prejuízo – afinal, os dois subiram pra isso, já perderam parte da manhã nessa batalha, agora vão fazer o quê? “Bem, agora é aturar a novidade e correr atrás do tempo perdido”, considera Manoel pra o amigo lúcido diante do óbice. E já os vemos de volta ao centro, destoando vibratoriamente da grosseria coletivizada e instituída que pulula pelo espaço urbano visivelmente apocalíptico. Vendedores ambulantes, jovens vestidos com extravagância típica do desamparo em todas as dimensões, seres vagando parece que unicamente para levar a passear a carantonha exprimindo o próprio fracasso, outros exibindo sem cerimônia a facies da infelicidade a que se resignaram como irreversível. E carros, carros, carrões, veículos, anúncios em profusão para vender, para excitar o consumo, e zumbis vagando a esmo, percursos vazios pelo teor do simplesmente obrigatório, a obediência servil à obrigação como sendo vida, quando é exatamente o oposto. E tome carrocinha de água de côco, de sorvete barato, recolhedores de lixo e papel, meninas esticando faixa quando o sinal fecha, moleques sem rumo macaqueando perdidos e excitados por pura energia da infância, cachorros integrando a cena do Estado em frangalhos. Nenhum gato visível, claro, que gatos não integram barafundas ridículas. Enter.
“Engraçado, caro Fox, observe que a explosão e o despedaçamento são visíveis como ingredientes desse quadro dantesco de social em absoluto colapso vivo, mas alguma força mantém esse estado de coisas sob contenção e controle!...”, considera Manoel meio que descoroçoado, como que somente cumprindo a obrigação filosófica de praticar a consciência crítica. O amigo Fox, músico mas pensador, homem dado ao estudo e à leitura em profundidade, mete sua frase jazzística em apoio à colocação de Manoel: “Alguma força controla isso, óbvio, porque é a mesma que engendra isso. Só nos resta questionar se isso poderá escapar ao controle dos responsáveis por esse quadro conjuntural. Talvez sejamos supreendidos por um desmoronamento desse edifício de horror, mas a mim parece que somente através da fúria dos elementos, porque toda essa feiúra e tanta desarmonia devem estar agredindo a ordem e a estética da Natureza". Enter final.
E nossos enviados ao mundo dos zumbis já naturalmente se encaminham de volta para seus domicílios, frustrados apenas por terem perdido tempo e por verem a perspectiva de prolongamento dessa tarefa de recolher os caraminguás devidos ao impoluto Fox, artista assumido como tal e de todo desinteressado de qualquer aparição pública tocando sua música refinada. Música, esta, imprópria para ouvidos córneos, moucos, emporcalhados e incrustados por matéria sonora deletéria que o Sistema despeja como terrorismo visando abestalhar, alienar, burrificar. E lá tomam o busildes de volta, vazio morro acima, fugindo da turba ignara que pulula alhures. “Sabe-se lá que fazem em casa essas criaturas que vagam por aí, réplicas de seres humanos entupidas de desejos e sob tratamento de choque televisivo”, considera Manoel em conversa de despedida com Fox enquanto os dois contemplam a fauna imbecil que formiga ou se aboleta burramente pela pracita sem objetivo que não uma subserviência cega ao poder absurdo e intangível. E Fox completa, bem humorado: “Per publicam viam ne ambules”, e os dois amigos se despedem com o riso cúmplice dos sabedores das coisas. E Manoel volta para sua linda Maria, que já perfuma a casa com os aromas do almoço. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Manoel e a morte do presidente polonês

Frederico Mendonça de Oliveira

“Avião Tupolev TU 154 cai com presidente polonês e comitiva de quase cem autoridades polonesas e morrem todos???”, pergunta-se em voz alta Manoel, alvoroçado com a notícia. Só que ele ainda não sabia de tudo, e sua amada Maria, lendo suavemente a notícia que se segue, deixou boquiaberto seu apaixonado marido. Ela pausadamente passou o texto que via no computador: “O presidente da Polônia, Lech Kaczynski, morreu na queda de um avião neste sábado (10), na região do aeroporto de Smolensk, no oeste da Rússia, informou o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da Polônia, Piotr Paszkowski. Havia 97 pessoas a bordo, segundo as autoridades russas, e ninguém sobreviveu. Não há ainda informações precisas sobre as circunstâncias da queda da aeronave, um Tupolev TU-154, que decolou de Varsóvia. As autoridades locais informam que o avião caiu cerca de 1,5 km do pouso, durante manobra de aproximação ao aeroporto de Smolensk. O acidente ocorreu às 10h50 locais (3h50 de Brasília)”. E Manoel se abestalha: “Você disse Smolensky, ó minha Maria? É isso que está escrito aí? Meu Deus, então isso é Katin outra vez! Meu Deus!! Outra vez???”, estatela-se nosso herói. Bem, por que tanto impacto? Por que Manoel se alvoroçou ao ouvir o nome Smolensky, e por que citou Katin? Isto é o que saberemos agora. Enter.
“Primeiro, é pouco provável a possibilidade de mero acidente numa circunstância dessas. Tratava-se de um avião presidencial, cheio de autoridades. Um piloto para essa função tem de ser um mestre graduadíssimo! Falha humana? Pouco provável... Falha técnica do tipo fadiga estrutural ou peça desgastada causando colapso da aeronave? Muito menos provável ainda. Sabotagem? Ora, em todo desastre em que se encontrem reunidos membros de uma organização importante isso é perfeitamente pensável – vide Alcântara, aquela explosão inaceitável ocorrendo justamente quando estava reunida pela primeira e única vez na história da base toda a equipe de cientistas aeroespaciais brasileiros. Portanto, a hipótese de sabotagem ou atentado é mais que procedente”, considera Manoel para sua lindamente atenta Maria. “Mas a coisa seria apenas hipótese entre outras visões até opositivas em conteúdo – não fosse Smolensky e a intenção da viagem. Aí, não nos resta senão botar não uma pulga, mas um cágado atrás da orelha. O que acontece, minha linda, é que eles iam lá homenagear os milhares de oficiais poloneses mortos pelos soviéticos entre setembro e outubro de 1941 na floresta de Katin. Isso é uma chaga na história dos dois países e uma chaga na História. Se a turma ia lá mexer na ferida, fica um tanto estranho demais essa ‘queima’ ser simples acidente. Os soviéticos, naqueles dias de Stálin, tentaram jogar a culpa nos alemães, mas não colou: acabou que a coisa tresandou, e os comunas se viram pilhados como responsáveis diretos pela tenebrosa chacina, tudo completamente comprovado, tudo irrespondível. Começou com a averiguação dos projéteis encontrados nas nucas dos cadáveres: projéteis Greco, impróprios para as armas dos alemães, Mauser e Walter. E aí ficou claro que os soviéticos caíram em escandalosa incriminação”. Nosso herói respira, se recompõe apoiado na pia em que se encosta há dez anos tomando cerveja e conversando com sua amada, sempre sentada na diagonal dele na copa, dificilmente sem gato no colo. Manoel para e reflete, e se inspira de novo, olhos brilhando de lembrar coisas. Enter.
“Pois é, minha linda. Li há bons dez anos O Massacre de Katin, do Sérgio Oliveira, gaúcho, pesquisador de grande garra. Escrita simples mas correta e muito rica e direta. Pois ainda reli, consultei também por várias vezes, e o que tenho a dizer é mais sério ainda. É que a atual Rússia tenta cinicamente deletar da História essa mancha incriminadora, aliás ato de inadmissível barbárie, e a Polônia verga até hoje lembrando seus filhos, a elite militar do país, todos covardemente assassinados. E ultimamente o Putin – que não sei se não passa de um putinho, basta lembrar a aliança dele com o boçal Bush – até andou admitindo a responsabilidade total da União Soviética no massacre. Isto depois de, por diversas vezes, a Rússia tentar escapulir da responsabilidade. E agora a Polônia se posiciona sem escolha, porque o problema se encavalou a partir dessa tragédia tão no espírito de uma ‘coincidência’”. E Manoel e Maria se entreolham espantados, quando Maria mostra no monitor a imagem do piloto polonês Robert Kubica, da Renault, uma fisionomia pra lá de intrigada, mas também com algum traço de incredulidade e de abjeção diante do fato. E as declarações dele são cautelosas até, mas apontam para uma dúvida cruel: “O acidente também tirou a vida da cúpula do (atual) exército do país. A aeronave rumava para a cidade de Katyn, onde haveria uma cerimônia para lembrar o 70º aniversário do massacre ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial - milhares de prisioneiros de guerra foram assassinados pelos soviéticos. Estou muito abalado e entristecido pela notícia desta tragédia, que não tem precedentes em nossa nação. O dia de lembrar as vítimas de Katyn se tornou uma data de luto para o povo da Polônia, disse Kubica, com cara de encafifado. Enter.
“E agora, que fazer??”, pergunta-se Manoel olhando para sua concentrada Maria, que encara o caso com uma atenção especial e muito aprofundada se comparada à atenção com que sempre olha questões políticas. Na verdade, trata-se de uma questão diplomática extremamente delicada, e temos uma Polônia que não pode deixar de se sentir atingida em cheio e violentamente humilhada pela segunda vez em 70 anos e pela mesma gravíssima questão”, dispara nosso herói equilibradamente excitado pelos conteúdos da nova possível chacina. “A dúvida será atroz, não mais poderá sair da cabeça dos poloneses a idéia de uma bomba a bordo, de uma peça especialmente sabotada para colapsar sob as condições críticas do pouso, mesmo de um míssil terra-ar ou ar-ar. Neste último caso, bastaria um caça disparar um míssil tipo Sidewinder ou um Sparrow em versão russa e dar meia-volta e sumir. Se houvesse alguém que testemunhasse isso se atreveria a abrir o bico? Enfim, mataram milhares de oficiais na Segunda Guerra; agora morrem 97 em suspeitíssima tragédia... e alguém vai querer seguir atrás dessas perdas? Alguém vai querer se expor a uma sanha dessa ‘natureza’?”, rumina Manoel. Enter final.
Um discretíssimo sorriso banha o rosto de Maria quando ela vê Manoel estacar diante da geladeira e ficar quieto ali pensativo. Ele põe a mão na porta e... Maria já vai pegar o copo especial dele, uma caldeireta com grife de cervejaria... e também pega o copinho dela, um copo usado em São Paulo para servir “pingado”, também miniatura do “garoto” que era usado no Rio na década de 50. Sai a loura do congelador, e eles ternamente brindam, concentrados, e passam a conversar em silêncio, tacitamente dizendo: “Deus olhe pela Polônia!”. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 16 de abril de 2010

Manoel e as desesperadas crianças livres. E Sandra Annenberg

Frederico Mendonça de Oliveira

Manoel entra em supermercado para pegar coisitas que sua amada Maria lhe pediu, e pronto: criança amalucada pela frente. Decidido quanto ao percurso dentro do estabelecimento, que ele quer mínimo e o mais eficiente, ei-lo obstado por garoto tresloucado de alegria falsa realizando “outing” perante platéia imaginária ou mesmo presente, mas alheia. Manoel fica esperando que o doidivanazinho dê passagem, e a mãe do infelizinho nem aí: escolhe batatas & cenouras ignorando o filho. Este, em êxtase de estupidez sob o vácuo absurdo da liberdade que lhe impuseram, dança estupidamente com uma laranja verde na mão, parecendo um bêbado confiante na própria exibição perante platéia deslumbrada. Pula como bobo e dança parecendo psicopata desvairado, e Manoel, contristado, apenas aguarda contemplando a cena patética e buscando por onde fugir. Enter.
São as crianças “libertadas” pelas novas convenções estabelecidas pelos que detonam a vida no globo. Os donos do mundo material querem agora as crianças com toda a liberdade do mundo, que não sejam frustradas nem contrariadas e vivam em plenitude em contexto de todo favorável. Esquecidos propositalmente das diferenças individuais, embora deva haver direito igual para todos, o que jamais funcionou na prática, os “eleitos de Deus” e senhores do mundo e das leis impõem agora que crianças sejam soberanas e que adultos devam respeitá-las. “Perfeito, ó pás; mas... e os adultos? As crianças devem respeitá-los também? Ou seria isso ‘limitar a liberdade da infância’?”. O moleque tresloucado prossegue obstruindo a passagem, representando sua arte em plenitude, Manoel prossegue pensando por onde evadir-se – ou se vai dar meia volta e tentar outro corredor entre prateleiras outras onde não apareça um doidivanazinho aloprado fazendo “outing”. “Que diabos levará uma criança a achar que está causando deslumbramento ao agir como um maluquete? Estará ele feliz com isso? Ou será que apenas manifesta seu desequilíbrio proveniente da falta de amor dos pais?”, e seu pensamento vai até os já distantes dias de sua infância, quando o pau comia ee ele vacilasse diante dos adultos. Se se comportasse como esse moleque naqueles tempos, levaria logo uma sacudidela braba e ouviria: “Estás maluco? Queres ir prum hospício? Sossegue, moleque!”, e assim os adultos ensinavam bons modos, harmonia, ensinavam à criança como não causar inquietação em torno de si. Lição de vida, pois. Dada pelos pais, tios, avós, para ele aprender em casa e em família como ter conduta equilibrada. Caso contrário, a rua ensinará... Enter.
A mãe do maluquinho, uma criatura estranha absorta em suas escolhas, observa o infeliz destrambelhado e diz: “Paulinho, vem cá!...”, e o pobre louquinho ignora a chamada, que seria puro pretexto para continuar sua palhaçada infeliz. “Atualmente é só isso pelas ruas e lojas: filhos praticando desobediência explícita, e os pais exibindo sua impotência em público, aliás parecendo achar isso realmente digno de exibição. A inépcia, parece, enche essa gente de um orgulho masoquista. Demonstram incapacidade para lidar com crianças tanto quanto se mostram completamente divorciados delas. Como dizia a psicóloga Lúcia Bello, naquele distante 1978 em que eu fazia terapia por ter enveredado por caminho que eu, no fundo, sabia falso, ‘Infelizmente..., graças a Deus’. Isto é: eu me queixo das coisas que me incomodam, mas no fundo é isso mesmo que procuro. Esses pais dizem: ‘Não tenho tempo, infelizmente, para meus filhos’, eles dizem da boca pra fora; no fundo, querem se livrar o máximo possível de qualquer responsabilidade para com estes pentelhos. ‘Infelizmente não tenho tempo; e é isso mesmo que quero: vão pro diabo essas pestes que me tolhem!’. E o que será dessas ‘pestes’?”, pergunta-se meio sacaneado nosso herói, conjeturando sobre um futuro sombrio espreitando essas pobres vidas desassistidas. Enter.
Cobradores e motoristas de ônibus andam putos com o que os pais deixam as crianças fazerem com o veículo em movimento; pessoal de supermercado, de lojas, de bancos, todos andam putos de ver a grosseira falta de responsabilidade e atenção de pais para com as crianças que os acompanham. “Outro dia um pai fazia compras no supermercado enquanto seu filho fazia estripulias e correrias pelos corredores. Até que o menino derrubou e quebrou quatro garrafas de vinho importado. Quando apresentamos a conta do prejuízo, o pai alegou que não pagaria, até porque as garrafas não estavam bem arrumadas na prateleira, e a culpa não era do menino”, relatou revoltado o gerente de um supermercado amigo de Manoel, revelando ainda que não teve como cobrar do cliente safado o prejuízo causado por sua falta de atenção com seu filho. “A prosseguir essa toada, vai ser preju atrás de preju, e as crianças vão até achar que fazer isso é um novo divertimento, uma nova brincadeira – e isso não vai ter remédio!”, comentou Manoel com o gerente, que só soltou um “Pior (é) que é!...”, e o surrealismo vai tomando conta dos nossos dias, transformando o viver num absurdo, numa peça teatral em que o eixo é a ausência de sentido na vida. Enter final.
“Ontem de manhã, um menino louco no ônibus, que agia como um transtornado mental surtado; à tarde, no banco, um doidivanazinho ainda com a fantasia da festa na escola fazia seu teatro de exibicionismo desesperado causando mal estar em todos os clientes, que são obrigados a presenciar demência infantil consentida ou, pior, ignorada e até mesmo incentivada pelos pais. Agora, saio para uma compra rápida e lá está outro louquete se exibindo diante de sua platéia imaginária, sem contar que, em outro corredor do supermercado, um casal de irmãos de seus oito a dez anos corriam e gritavam por entre prateleiras e clientes como se ali fosse espaço para recreio infantil. Puta merda, que diabos virarão esses infelizes?”, e lá vai nosso herói com mais um galo na testa para a rua, levando poucas sacolas e muita indignação – porque na verdade verifica serem os pais uns coniventes safados, felizes com a liberação dos fedelhos, na verdade agradecendo pelas “novas regras”, até porque encontrando nelas a brecha para se eximir de responsabilidades e, mais asqueroso ainda, promover a estética da estupidez, que neles cai como uma luva. “E tome camisas listradas, e vamos vivendo uma hospicialização do cotidiano, atendendo aos interesses dos que destroem tudo para imperar geral!”. E por falar em camisas listradas, os que se destroem assistindo a coisas como o Jornal Hoje acabaram estranhando – ENFIM!!! – os comentários da abissal Sandra Annenberg, que, reportando o fato de a ressaca do mar no litoral fluminense estar devolvendo para a praia joias, dinheiros e objetos de valor, o que atrai pessoas interessadas em achar os objetos, “devolveu”: "Quero crer que o que está sendo devolvido pelo mar seja devolvido também para os donos que perderam", disse. Manoel comenta com Maria, que só reflete sobre esse lixo, silente e linda: “O Hoje é jornaleco funesto e horrendo; com comentários como os dessa criatura, confirma ser pura escatologia, e temperada com cretinices!” E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

terça-feira, 6 de abril de 2010

Manoel, o caos urbano e a degenerescência geral

Frederico Mendonça de Oliveira

Carros, idioma e o simples empunhar de uma caneta. O ruído emitido por emissoras da mídia absolutamente amorais, quando não descaradamente imorais. O lixo de imagens e conteúdos despejado pela TV aberta. A corrupção generalizada e completamente implantada no País. “Meu Deus, o que querem os brasileiros ao se permitirem degenerar social e moralmente em tal velocidade??”, pergunta-se um Manoel abestalhado com o que tem sofrido até dentro de sua própria casa. “Se ligar a TV, lá vem porcariada grossa; se ligar o rádio, o mesmo. Só se vê gente estúpida pulando à nossa frente ou seres abissais berrando boçalidades no ar. São os ‘famosos’, que não precisam de nada para alcançar a fama, basta conseguir furar o esquema e se enturmar entre seus semelhantes, igualmente asininos. Hoje a boa aparência mais vulgar é objeto de admiração babosa. O sujeito tem aspecto legalzinho? Pois já se candidata a ser famoso”, dispara nosso herói, entre irritado e comiserado. Então vale viajarmos com ele em seu calvário, ele que tem um coração do tamanho de uma jaca e sofre como se para nos salvar a todos. Enter.
Eis Manoel indo resolver coisitas intransferíveis de seu cotidiano, ei-lo se aventurando pelo arraial afora. Foi parar lá pras periferias de oeste, que ele não conhecia. Ficou abismado com a quantidade assustadora de habitações inacabadas espalhadas por uma área urbana periférica de perder de vista: “Meu Deus!, já existem no arraial favelas de classe média baixa, aquela gente ignara que se reproduz como coelhos e porquinhos da Índia e entopem as ruas do centro como procissão de zumbis em busca de inserção social que jamais alcançarão – simplesmente por serem eles mesmos a desintegração viva do social. Parecem seres em decomposição da própria imagem, pois vestem roupas como que em proposital e assumido desalinho, panos coloridos enormes em excesso de dimensões, parecem querer representar o papel de espantalhos. E o são...”. E, considerando esses seres completamente perdidos no turbilhão atroz do capitalismo selvagem tupiniquim sulmineiro, Manoel avalia a ação dos causadores de tamanha distorção. “Quem estará por trás de tal desgraça que vai dilacerando o plano social e transformando o povo brasileiro numa legião de humanóides vagando estupidamente como mortos-vivos em busca de desejos fúteis?” Enter.
Bem, era necessário comprar terra vegetal com húmus de minhoca para replantar pimenteiras, cebolinha, tomateiros, rúculas, coisinhas que Maria adora ter fresquinhas à mesa. E lá vai o nosso pobre entrar na loja de um real, e começa o perigo. Lá vem alguém em sua direção seguramente perguntar se “pode ajudar em alguma coisa”. “Oh!, raios, deixa eu fugir daqui, para poder procurar à vontade o que eu quero”. Escapou do canifraz malaco e sorridente que vinha em sua direção. Achou a terra embalada em sacos, sem problemas, botou dois debaixo do braço; achou os sacos de 100 litros, estavam bem ali, pertinho da terra ensacada. Ligou de celular pra Maria, e recebeu dela a incumbência de trazer pano para a cozinha e a lembrança de comprar forminhas de empada, usada por ele para acender a churrasqueira e o fogão a lenha (que os macacos sem rabo chamam de “fogão de lenha” ou de “fogão à lenha”, duas asneiras bem ao estilo da macacada destas montanhas. “Se fosse fogão de lenha, ele se queimaria a cada acendida, e se acabaria, transformado em cinzas; e se fosse fogão à lenha seria um fogão colocado sobre a lenha, ou no meio dela, diabos! Será que não pensam??” Então Manoel acaba que faz a compra sem ser importunado. Aí vem a coisa de passar na caixa para pagar. E lá está a moça escrevendo como se seus dedos fossem garras de predador tentando esmagar a presa. Ninguém mais sabe empunhar uma caneta: não há mais qualquer princípio nesse sentido, como, de resto, não há mais qualquer princípio em nenhum sentido, mantendo-se, para certos casos considerados importantes, a aparência dos princípios. Acabada a sessão, retoma-se a barbárie, que ninguém é de ferro. Comiserado com ver a moça perguntar “Quer que eu embrulho?”, Manoel deixa a loja doído de constatar a morte do idioma de Camões. Enter.
E nosso herói se lembra de uma situação rara, em que se assumiu um radical em defesa de seus princípios morais, idiomáticos e estéticos. Ele assistia a seu amigo músico trabalhando: o cara gravava com um sujeito também músico e dono/operador de estúdio. Lá pras tantas a gravação foi interrompida para atender a um chamado telefônico. Era da empresa de manutenção de computadores, avisavam que as máquinas deixadas lá já estavam prontas. Manoel contemplava a conversação. O cara disse: “Sim, pode trazer, pode VIM”. Depois de pequena pausa, em que do outro lado perguntavam qual era o endereço, ele responde: “Sabe onde é o restOrante do Simeão? É ao lado”. E, voltando-se para o amigo de Manoel, que esperava de guitarra calada acabar a negociação, perguntou: “Quer que eu gravo?” Diante desse surto de grosseria e mau gosto, Manoel fez um discreto sinal para seu amigo e foi saindo de fininho, sem ser notado pelo bugre depredador da língua. Depois confessou ao amigo que não mais falaria com esse tipo que defeca no idioma, tipo aliás por quem antes nutria certo respeito e admiração por ser ele muito hábil em algumas coisas. E lá foi Manoel em frente, quando abriu um jornal e logo o fechou, soltando um muxoxo triste: em destaque, uma frase em que se vê a terminalidade da língua portuguesa: “Feliz igual pinto no lixo”. Considerando que quem escreveu isso é mesmo despreparado e mal alcança regras de fala, porque fala como ouve falarem, Manoel até compreende a pobreza, mas regra é regra: uma coisa é igual A outra, não “igual outra”. Em outra ocasião, leu na Caros Amigos um juiz – homem, portanto, a quem não se atribuiria falar de baixo nível – falar “dali dez dias”. Bem, esse cara cursou faculdade, tem instrução, e fala como um bugre?? Será que esse indivíduo fala assim em audiência ou em palestra para públicos seletos? Onde está pelo menos o senso estético?? Enter final.
E assim vai a vaca pro brejo. Nosso herói foi até um bairro afastado pegar um violão que foi reformado por um fabricante de instrumentos. “A teratologia se instala nos seres, nas instituições, e a feiúra se manifesta em plenitude, explodindo em estética de periferia, aquele cenário em que a necessidade se impõe como prioridade. Então, em espaços urbanos periféricos, o que importa é a coisa imediata. É fundamental morar. Então levanta-se um barraco de alvenaria e enfia-se a macacada dentro dele. O visual cede ao pragmatismo, e como o único prazer de pobre é fornicar, porque hoje é de graça e muitíssimo fácil, vai crescendo a população de bugres em progressão geométrica. E o cenário é o da feiúra instituída, porque o feio está no processo da escatologia de que falaram os profetas. Não há mais salvação para quem sonhou com um progresso real da Humanidade. Hoje, vale o que os conquistadores do mundo querem que seja feito. Morte à beleza, morte à nobreza de caráter, morte às instituições, morte ao ambiente, morte à inteligência, morte ao planeta, morte aos anseios de aperfeiçoamento do homem. Vale agora é ir como a boiada dentro do trem sem saber que vai em direção ao matadouro: mesmo sem saber o fim que a espera, a Humanidade caminha a passos firmes para o abismo, para o despedaçamento de tudo, para o cataclismo”. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 2 de abril de 2010

Manoel e o afrodescendente tresloucado solto por aí

Frederico Mendonça de Oliveira

“Pois é: se estivéssemos naquela virada dos anos 50 para os 60 no Brasil, poderíamos usar o termo usado por Stanislaw Ponte Preta, aliás Sérgio Porto, cronista impagável, para sua composição inesquecível, Samba do Crioulo Doido. Hoje é isso aí: ‘Binário do Afrodescendente Tresloucado’, senão dá processo... Reportar podemos; falar abertamente, não”, reflete Manoel a respeito de tanta loucura que vemos explodir diante de nossos narizes sem nada poder fazer. É que nosso herói sofre
sendo alvejado de todos os lados com manifestações de insanidade mental individual e coletiva, e pensa em Deus e no Cristo, e acaba diante do congelador, sossegando o espírito através de considerar deglutir os goles inebriantes de uma loura gelada. Fazer o quê? Chorar sob o cobertor? Mas, como, cobertor?, em pleno começo de outono, com o calor de verão ainda tórrido, derretendo asfalto? Mas vamos ao desfile das loucuras explícitas. Enter.
Naqueles tempos da pesada, quando chegava a Bossa Nova e no mesmo ano o Brasil virava campeão mundial de futebol, vivíamos um temor diante do que pensávamos ser doenças sociais curáveis. Uma delas, o aumento da presença do automóvel. Mas a revista Senhor, lançada por aqueles tempos, apresentava uma profética charge: pai e filho, de cima de uma cobertura em Copacabana, olhavam lá pra baixo, e o pai dizia pro filho: “Tá vendo, meu filho? Nunca mais conseguiram tirar os carros do grande engarrafamento de 1990!”. E Manoel, então em seus 15 e já no Brasil, viu aquilo e guardou em sua prodigiosa memória. Pois hoje ele comenta com sua amada Maria: “Tu vês? Estive no centro deste Arraial das Bagas e presenciei um espetáculo absurdo: parece existirem mais carros que gente no centro e adjacências dele neste arraial! Um dia esta merda vai travar, e vai acontecer aqui, nesta aldeia entre montanhas, o que foi profetizado na charge do fim da década de 50!” E Maria, pela primeira vez assumindo uma fala direta neste espaço, comentou: “Pois veja, querido, o que saiu hoje na Folha: ‘Vendas (de automóveis) cresceram 17,9% ante o mesmo intervalo no ano passado estimuladas pelos últimos meses do IPI reduzido, que vigorou até ontem’; a continuar isso, estaremos entupidos de carros sem poder andar nas ruas senão por sobre eles!”. E o casal se entreolha ternamente, seguro de nada poder contra a degenerescência, mas consciente de que, se estão enfrentando esta conjuntura, não será senão porque para ela contribuíram de alguma forma no passado intangível. Enter.
E a imprensa noticia os engarrafamentos monumentais, as horas e horas perdidas por habitantes de capitais no trânsito diário, mas prossegue intransigentemente a serviço das indústrias de veículos, especialmente porque elas pagam anúncios caríssimos, muito embora tudo leve a uma compreensão do irremediável: se cresce a demanda de veículos dentro de um espaço limitado e que não acompanha tal crescimento hoje beirando o vertiginoso, teremos colapsos graves de fluxo de tráfego em breve, e disseminados por todo o país. “É o capitalismo selvagem devastando através de instaurar a era do automóvel, doença maligna em nossa história, que traz com ela outros transtornos horrendos, que são as doenças decorrentes do aumento do sedentarismo, porque o motorista acaba também um sedentário à direção, um ser que acaba amplificando seu sedentarismo já consolidado no trabalho, no escritório, no banco, mas, pior, obrigatório na poltrona diante da TV, e mais sedentarizado ainda nesses dias tecnológicos, porque assistindo TV e mudando de canal usando controle remoto... que visão aterrorizante, ó Maria!”. E Maria, ocupada em suas funções, que desempenha com religiosidade santa, aquiesce lentamente com a cabeça enquanto avalia as roupas lavadas e cheirosas de seu toque de fêmea feliz e que dobra com cuidado e reverência. “E o mais importante é a completa falta de consciência diante do que se avizinha assustadoramente! Todos só querem saber de ter carro e dirigir, não se importando com o que isso haverá de significar em curto prazo!” Enter.
E a tudo isso acaba que podemos chamar de hipocrisia deslavada. “Forniquem-se todos: se os capitalistas querem lucro, o planeta que vá pro inferno!”, é o que parece dizerem os que comandam o poder mundial da finança perversa, desumana, dos meios de comunicação desagragadores de valores e instituições e que têm as armas na mão para quando for necessário meter mísseis e bombas contra nacionalidades não suscetíveis à sanha devoradora dos donos do mundo. E agora vem essa história de pedofilia envolvendo o Papa. “Sim, sim, pode existir isso, sim, e não podemos apostar na santidade dos que cercam Sua Santidade. Se aconteceu, se acontece, é tomar providências, e que quem tiver culpa no cartório, que pague. Mas.... que moral tem essa imprensa porca, difusora de depravação explícita, de podridão desenfreada, para “se escandalizar” diante de qualquer coisa? Lembram do cônsul de Israel no Brasil em 2000, Arie Scher? Lembram que estourou como um traque – não tem igreja católica no meio, não vira bomba... – a notícia de que o cara era agente internacional de prostituição e que foram encontradas com o professor Georges Schteinberg, seu amigo e amante, 12 fitas de vídeo e 154 fotos eróticas de menores, e que tudo isso foi produzido na cobertura de Scher, em Ipanema, e que ele se refugiou na embaixada e se pirulitou do Brasil ajudado por poderosos – que impediram a ação da Polícia Federal – e que nunca mais se falou nisso? O juiz da Infância e da Juventude Siro Darlan lamentou a impunidade em nota à imprensa: “O bandido escapou, e a Polícia Federal sabia do caso”. Segundo matéria na Isto É de 12/7/2000, “a maioria das fotos apreendidas mostra meninas nuas na piscina, outras revelam intimidades entre o professor e o cônsul” e “uma das mensagens (que o cônsul mandava para seus amigos no mundo inteiro) seguiu com a foto de uma jovem de biquíni sentada no carro do consulado. Agora sabem que Scher está envolvido com prostituição infantil”. “Então, ‘imprensa’, como é que fica? O mundo inteiro soube disso? O Brasil inteiro? Merda nenhuma! Só ficou sabendo quem esquadrinha a revista que revelou a bagaça...”. Enter final.
“E que dizer dessa pouca vergonha de BBB, em que mulas e bugres se esfregam e trepam nas fuças do público telespectador? E que dizer de coisas como ‘dança da garrafa’, em que crianças faziam gestos eróticos dançando em trajes menores com a genitália roçando o gargalo de uma garrafa? Ora, crápulas imundos, vão lavar essa bunda!!”. Bem, nosso herói está longe de apoiar pedofilia, mas se reta com o fato de a mesma imprensa que incita à depravação venha com ares de perplexidade denunciar pedofilia no Vaticano embora cale sobre outros escândalos que não lhe interessa divulgar... “Vão pro diabo, pulhas!”, rosna Manoel. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!