quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Desventuras de um lusitano nas alterosas

Frederico Mendonça de Oliveira

Pois o Manoel, nosso herói, começou a não entender mais nada do que se passa no arraialito onde fixou residência. Primeiro, faz-se uma pracita num local onde antes existia um sistema de preservação ambiental, e a obra causou um fuzuê dos diabos: uns se aboletaram nos bancos levando cachorro, papagaio, mulher, filhos e netos, fazendo do espaço um prolongamento de suas dependências residenciais, com isso expondo aos outros seus hábitos que deveriam manter dentro de seus espaços; num certo fim de semana penduraram rede entre duas árvores e se ajuntaram como um bando de retirantes, como se estivessem em sua sala de convivência; de outra feita, armaram até tenda de camping para as crianças “acamparem”, levando farnel e o diabo. Pelas manhãs, especialmente aos sábados, reúne-se uma criançada desgraçadamente barulhenta, brincando como um bando de diabinhos enlouquecidos mortificando com gritos finos e altíssimos os ouvidos de seres educados e sensíveis que moram colados à pracita. As babás e mamães que acompanham esses infelizezitos simplesmente ignoram os putinhos, ocupando-se em palrar entre si sobre sabe-se lá que besteiras, que elas chamam de “assuntos”. E como se plantou grama no espaço, volta e meia aparecem malucas e malucos com farnéis e armam piqueniques com toalha de mesa e tudo mais: biscoutos, pets de refrigerante, sanduíches e tal, e a turma dos que são aqui no Brasil chamados de baixinhos se esparrama fazendo algazarra, para estourar os ouvidos dos moradores no entorno. Enter.
E foi aí que o Manoel começou a dar tratos à bola, especialmente considerando que o negócio de os brasileiros dizerem que portugueses são burros não está lá muito certo... porque portugueses não fazem esse tipo de maluquice como a que os brasileiros fazem, coisas como essa pracita. Pior ficou ainda quando o Manoel soube que um prefeito no Nordeste vendeu uma praça pública para um cidadão construir nela seu negócio, por sinal uma lanchonete. E mais impressionante ainda ficou quando deu na TV – que os brasileiros usam como sendo o oratório de suas casas no caso de serem católicos praticantes, o que os emburrece, esta forma de usar a TV, crescentemente, coisa que eles, parece, não notam – que um morador de uma cidade mineira, Juiz de Fora, construiu sua casa numa área verde como a que foi transformada em praça perto da casa dele, fato que deu notícia em âmbito nacional, embora pareça que isso vai virando moda nas montanhas de Minas e fora delas. Danou-se tudo no bestunto de nosso querido Manoel quando foi verificado que, no extremo oeste da área verde que virou praça em seu arraialito, também foi construída uma casa, que toma quase toda a largura do espaço, deixando apenas uma passagem para algum pedestre que por ali se desloque – isto sem contar que no outro extremo, a leste, a área é inacreditavelmente usada como estacionamento de carros para o clube cuja portaria fica bem em frente. Enter.
Queres mais, ó pá? Bem, Manoel já anda querendo voltar a Portugal para comentar sobre tudo isso, só evitando falar com a Maria se os dois estiverem realizando quecas em tardes de cio e vagares. Outra broxada, lá isto não! Mas que tem certeza de que vai fazer sucesso entre seus amigos e circunstantes contando as “modas” do Brasil, lá isto não há negar... especialmente se souberem que os que defendem a lei – não só os que habitam as montanhas onde fica o arraialito, mas no Brasil como um todo – são perseguidos de todas as maneiras, inclusive sendo proibidos de falar sobre o assunto. Haja vinho, bacalhau, sardinha e tremoços para agüentar tanta maluquice!... associada a burrice! Enter final.
Manoel já anda pensando em afivelar as malas e pegar um TAP (Transportes Aéreos Portugueses), companhia que no Brasil chamam de “tamancos aéreos portugueses”, sem contar que até locutores de TV falam “compania”, os intelijumentos – êpa! Já está o Manoel a dizeire que os brasileiros são burros!... –, e cruzaire o Atlântico para ouvir falas civilizadas, já que as últimas experiências no arraialito são de fazer levantar as orelhas de uma besta quadrada. Não se vá atribuir ao Brasil aquilo que não se deve, outrossim: se elegeram Lula presidente, Clodovil deputado e Severino Cavalcante presidente do Congresso, e se Lula está cercado de corruptos que pintam os canecos e ele jura que de nada sabe, admitamos que podemos considerar os brasileiros uns refinados quadrúpedes... embora saibamos que ainda exista vida inteligente entre o Oiapoque e o Chuí – mas isto anda muito escasso!... E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!