Frederico Mendonça de Oliveira
Examinando os fatos ocorridos no arraialito desde uns três anos pra cá, Manoel se deu conta de um admirável processo de “evolução social”, algo que rima admiravelmente com o que se passa no Congresso, a que nosso ex-presidenti se referiu, quando ainda metalúrgico, como sendo um antro de centenas de picaretas. Eleito chefe da “nação”, inaugurando uma era absolutamente surrealista em nossa História, o “presidente-operário” logo inverteu sua postura em 180 graus e passou a operar em comunhão com os tais picaretas, do que aflorou o escrotérrimo episódio do mensalão. Pois no arraialito as coisas andam a mil, especialmente no que diz respeito a perseguir odiosamente quem ousar não apoiar corrupção. E um amigo de Manoel sofre isso, e nosso herói captou, com câmeras e gravadores ocultos, trabalhando com ajuda de diversos amigos considerados neutros pelos que comandam a perseguição, falas e manifestações dessa turma. É o que se pode verificar adiante, falas, fatos e cenas que nos deixam confiantes no futuro desse lugar chamado Brasil. Enter.
“Temos que acabar com esse cara! Ele é muito perigoso! Não quis participar da jogada de transformação do pedaço, veio com papo de que é ilegal... Ora, tem gente do ramo na obra, quem é que vai discutir com padre o que vai ser dito na missa? O cara é metido a superior, o nome dele sai na TV e nos jornais volta e meia, ele tem amigos na imprensa, ele é compretamente diferente de todo mundo, é um perigo um cara desses solto aqui, no meio da gente!”, essa foi uma fala ouvida num botequim-armazém em que se reúnem tipos do bairro pra jogar sinuquinha antes da hora da janta. O outro fala: “É, ele é metido até! Não tem carro, não tem cachorro, a casa dele não tem parabólica como todo mundo, tá sempre com gatos no jardim e na frente da casa, parece que não é normal... e a gente não sabe se é casado, a vida dele é um mistério, não é como a gente, que tem patroa velha que todo mundo conhece...”. E nosso herói até foi instado a dar notícias sobre o sujeito, mas fingiu receber uma ligação no celular e saiu pra fora, para atender e fingir que estava com dificuldade de ouvir. E saiu de fininho, deixando os tipos lá, conluiados na conspiração. Enter.
Em outra ocasião, no supermercado, Manoel e um amigo portando câmara na caneta clipada no bolso da camisa surpreenderam dois sujeitos falando sobre o assunto: “O negócio é pegar ele! Botar as crianças no lugar todo dia, fazer gritaria na porta do cara sem parar, pra ele aprender a se comportar como gente! E a gente podia também arranjar quem dê um pau nele... mas por enquanto a gente vai jogando sacos com porcaria e pets com mijo no jardim dele, chama os vagabundos da praça pra ir fazer baderna lá, espalha que o cara é louco, que não gosta de criança, diz pras crianças que a casa dele é mal assombrada, o lance é acabar com a paz desse filho da puta, que acha que pode falar em lei se não é nem advogado! Tem um vizinho dele que é de arte marcial e que tá arrumando um jeito de provocar pra ele reagir, e aí, já viu, né... Esse cara a gente nem sabe de onde vem, mas é sujo pra cacete! Já chamou o cara de vagabundo, já disse aos gritos que ele não é homem, e o cara nem reagiu, sabe que não pode, talvez porque esteja sob processo...”, e ficou tudo registrado no gravador do celular e na câmara da caneta do amigo de Manoel. Mas não pára por aí a loucura que vem trazendo uma alegria diferente para os moradores que perseguem um homem que hoje só falta ser assassinado... Enter.
Maria vai uma ou duas vezes por ano ao cabeleireiro, e vai em estabelecimento sem maior glamour. Mas um dia não encontrou como cortar seu cabelo e teve de ir a um salão mais badalado, e eis que lá, sentada entre dondocas, entre elas a mulher de um maioral do arraialito, ouviu as conversas entre as figuras e voltou pra casa horrorizada. As mulheres se referiam ao cara pelo nome, diziam que estão infernizando as manhãs dele usando os próprios filhos, que falam pros filhos gritarem o mais que possam, que aquele lugar tem que virar um inferno pra ver se tiram o cara de lá. Uma delas contou que um dia botou o filho, que ainda engatinha, bem no portão do cara, e ficou em pé olhando pra dentro da casa, provocando e dando risada. Outra falou que inventou musiquinha de deboche e que a ensinou às crianças, para cantarem quando o cara ou gente dele entrarem e saírem da casa. Falavam isso entre risadas de delícia, como se para elas perseguir um idoso e causar-lhe mal estar e constrangimento seja uma adorável atividade de recreio. Maria ouviu tudo tendo engulhos, pensou até em se retirar, mas ficou, por dois motivos: um pra saber mais e mais sobre essa atividade monstruosa dessas mães; outro, porque poderia chamar a atenção desse tipo de criaturas, o que não ajudaria a vítima em nada. A fala mais imunda ela ouviu de uma jovem mamãe que deve ser mulher de outro maioral no arraialito: ela disse com alegria que, um dia, cruzando com o cara quando ela e outras mães, mais babás e crianças, fugiam do temporal que se aproximava, ela virou pro filho, que tem perto de um ano, e ficou dizendo pra ele: “Gritaaaa! Faz barulhoooo!! Gritaaa!! Faz barulhoooo!!!!”, e Maria ficou enojada com a alegria com que a mulher contava o fato, mãe irresponsável, instigando filho inocente contra quem não fez mal a ninguém! E consigo pensava: “Quando o crack pegar esse infeliz talvez ainda na infância, ela vai se horrorizar, achar que é uma injustiça de Deus para com ela...”, e voltou para casa com o coração amassado e a tristeza doendo, pensando na paz que vive com seu Manoel e no absurdo que é a mente dessa gente que vive um câncer na alma, seres carregados do pior dos instintos: o ódio intransitivo! Enter final.
Pois um amigo de Manoel se postou no local maldito munido de câmera e gravador, e ouviu as falas de dois idosos e mais um jovem que relaxavam numa manhã de domingo: “Tem que pegar esse cara de jeito. Ele quer que a gente deixe de desfrutar dessa mudança, e não importa se é ilegal. Teve um que bombardeou a casa dele com tijoladas, foi um bafafá e tanto, não sei como não saiu morte. Era pra dar merda grossa, mas o cara é safo, não caiu no horror! Foi até ameaçado de morte e não reagiu! Até falou com o agressor com bondade, chamando o cara pelo nome, e o agressor tava com craque até a alma, e ainda veio aquele tipo estranho tentar fazer a situação encardir, mas não deu! Mas uma hora a coisa rebenta, e a gente pega o cara... É questão de tempo. O cerco vai se apertando cada vez mais...”. Pois tudo isso, gravações, CDs com filmes, fotos, documentos vários, cópias dos processos injustos, tudo está devidamente registrado e distribuído por corregedorias, Polícia Federal, CNJ, redações e em setores de polícia de capitais. Resta Deus entrar em ação para fazer tudo isso explodir. E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té pra semana, babes!