Frederico Mendonça de Oliveira
Manoel entra em supermercado para pegar coisitas que sua amada Maria lhe pediu, e pronto: criança amalucada pela frente. Decidido quanto ao percurso dentro do estabelecimento, que ele quer mínimo e o mais eficiente, ei-lo obstado por garoto tresloucado de alegria falsa realizando “outing” perante platéia imaginária ou mesmo presente, mas alheia. Manoel fica esperando que o doidivanazinho dê passagem, e a mãe do infelizinho nem aí: escolhe batatas & cenouras ignorando o filho. Este, em êxtase de estupidez sob o vácuo absurdo da liberdade que lhe impuseram, dança estupidamente com uma laranja verde na mão, parecendo um bêbado confiante na própria exibição perante platéia deslumbrada. Pula como bobo e dança parecendo psicopata desvairado, e Manoel, contristado, apenas aguarda contemplando a cena patética e buscando por onde fugir. Enter.
São as crianças “libertadas” pelas novas convenções estabelecidas pelos que detonam a vida no globo. Os donos do mundo material querem agora as crianças com toda a liberdade do mundo, que não sejam frustradas nem contrariadas e vivam em plenitude em contexto de todo favorável. Esquecidos propositalmente das diferenças individuais, embora deva haver direito igual para todos, o que jamais funcionou na prática, os “eleitos de Deus” e senhores do mundo e das leis impõem agora que crianças sejam soberanas e que adultos devam respeitá-las. “Perfeito, ó pás; mas... e os adultos? As crianças devem respeitá-los também? Ou seria isso ‘limitar a liberdade da infância’?”. O moleque tresloucado prossegue obstruindo a passagem, representando sua arte em plenitude, Manoel prossegue pensando por onde evadir-se – ou se vai dar meia volta e tentar outro corredor entre prateleiras outras onde não apareça um doidivanazinho aloprado fazendo “outing”. “Que diabos levará uma criança a achar que está causando deslumbramento ao agir como um maluquete? Estará ele feliz com isso? Ou será que apenas manifesta seu desequilíbrio proveniente da falta de amor dos pais?”, e seu pensamento vai até os já distantes dias de sua infância, quando o pau comia ee ele vacilasse diante dos adultos. Se se comportasse como esse moleque naqueles tempos, levaria logo uma sacudidela braba e ouviria: “Estás maluco? Queres ir prum hospício? Sossegue, moleque!”, e assim os adultos ensinavam bons modos, harmonia, ensinavam à criança como não causar inquietação em torno de si. Lição de vida, pois. Dada pelos pais, tios, avós, para ele aprender em casa e em família como ter conduta equilibrada. Caso contrário, a rua ensinará... Enter.
A mãe do maluquinho, uma criatura estranha absorta em suas escolhas, observa o infeliz destrambelhado e diz: “Paulinho, vem cá!...”, e o pobre louquinho ignora a chamada, que seria puro pretexto para continuar sua palhaçada infeliz. “Atualmente é só isso pelas ruas e lojas: filhos praticando desobediência explícita, e os pais exibindo sua impotência em público, aliás parecendo achar isso realmente digno de exibição. A inépcia, parece, enche essa gente de um orgulho masoquista. Demonstram incapacidade para lidar com crianças tanto quanto se mostram completamente divorciados delas. Como dizia a psicóloga Lúcia Bello, naquele distante 1978 em que eu fazia terapia por ter enveredado por caminho que eu, no fundo, sabia falso, ‘Infelizmente..., graças a Deus’. Isto é: eu me queixo das coisas que me incomodam, mas no fundo é isso mesmo que procuro. Esses pais dizem: ‘Não tenho tempo, infelizmente, para meus filhos’, eles dizem da boca pra fora; no fundo, querem se livrar o máximo possível de qualquer responsabilidade para com estes pentelhos. ‘Infelizmente não tenho tempo; e é isso mesmo que quero: vão pro diabo essas pestes que me tolhem!’. E o que será dessas ‘pestes’?”, pergunta-se meio sacaneado nosso herói, conjeturando sobre um futuro sombrio espreitando essas pobres vidas desassistidas. Enter.
Cobradores e motoristas de ônibus andam putos com o que os pais deixam as crianças fazerem com o veículo em movimento; pessoal de supermercado, de lojas, de bancos, todos andam putos de ver a grosseira falta de responsabilidade e atenção de pais para com as crianças que os acompanham. “Outro dia um pai fazia compras no supermercado enquanto seu filho fazia estripulias e correrias pelos corredores. Até que o menino derrubou e quebrou quatro garrafas de vinho importado. Quando apresentamos a conta do prejuízo, o pai alegou que não pagaria, até porque as garrafas não estavam bem arrumadas na prateleira, e a culpa não era do menino”, relatou revoltado o gerente de um supermercado amigo de Manoel, revelando ainda que não teve como cobrar do cliente safado o prejuízo causado por sua falta de atenção com seu filho. “A prosseguir essa toada, vai ser preju atrás de preju, e as crianças vão até achar que fazer isso é um novo divertimento, uma nova brincadeira – e isso não vai ter remédio!”, comentou Manoel com o gerente, que só soltou um “Pior (é) que é!...”, e o surrealismo vai tomando conta dos nossos dias, transformando o viver num absurdo, numa peça teatral em que o eixo é a ausência de sentido na vida. Enter final.
“Ontem de manhã, um menino louco no ônibus, que agia como um transtornado mental surtado; à tarde, no banco, um doidivanazinho ainda com a fantasia da festa na escola fazia seu teatro de exibicionismo desesperado causando mal estar em todos os clientes, que são obrigados a presenciar demência infantil consentida ou, pior, ignorada e até mesmo incentivada pelos pais. Agora, saio para uma compra rápida e lá está outro louquete se exibindo diante de sua platéia imaginária, sem contar que, em outro corredor do supermercado, um casal de irmãos de seus oito a dez anos corriam e gritavam por entre prateleiras e clientes como se ali fosse espaço para recreio infantil. Puta merda, que diabos virarão esses infelizes?”, e lá vai nosso herói com mais um galo na testa para a rua, levando poucas sacolas e muita indignação – porque na verdade verifica serem os pais uns coniventes safados, felizes com a liberação dos fedelhos, na verdade agradecendo pelas “novas regras”, até porque encontrando nelas a brecha para se eximir de responsabilidades e, mais asqueroso ainda, promover a estética da estupidez, que neles cai como uma luva. “E tome camisas listradas, e vamos vivendo uma hospicialização do cotidiano, atendendo aos interesses dos que destroem tudo para imperar geral!”. E por falar em camisas listradas, os que se destroem assistindo a coisas como o Jornal Hoje acabaram estranhando – ENFIM!!! – os comentários da abissal Sandra Annenberg, que, reportando o fato de a ressaca do mar no litoral fluminense estar devolvendo para a praia joias, dinheiros e objetos de valor, o que atrai pessoas interessadas em achar os objetos, “devolveu”: "Quero crer que o que está sendo devolvido pelo mar seja devolvido também para os donos que perderam", disse. Manoel comenta com Maria, que só reflete sobre esse lixo, silente e linda: “O Hoje é jornaleco funesto e horrendo; com comentários como os dessa criatura, confirma ser pura escatologia, e temperada com cretinices!” E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!