segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Um lusitano e o Natal no Brasil

Frederico Mendonça de Oliveira

Manoel anda abestalhado, até mesmo atoleimado, também atarantado, parece que a idade lhe pesa estranhamente a partir da tal pracita que o transformou em motivo de gargalhadas – e até de uma bela brochada – quando andou investigando teores urbanísticos em Lisboa para elucidar suas dúvidas no arraialito em que se socou há 24 anos. Então, na azáfama de fim de ano, esse 2008 em que o Brasil naufragou mais ainda no oceano da incerteza e intensificou sua condição de terminalidade como país, eis Manoel perdido na multidão de arraialeiros bovinos, senão ovinos, senão muares, mas, seguramente, asininos. Vamos com Manoel às compras de Natal. Enter.
Preso numa fila de supermercado onde comprara mórteres (víveres são coisas do passado, quando os preços eram de manter a vida das pessoas) e bagulhos para curtição, como cerveja, algumas frutas, avelãs e coisas para a patroa fazer a festinha, eis que Manoel se sente aborrecido com alguma coisa insistente. Preso a suas divagações filosóficas mesmo que em fila de supermercado, ele é acordado de sua viagem por uma criança que grita como um capado ao sentir entrar o punhal em sua axila esquerda. Não se sabe o que levou o desgraçado putinho a tamanha birra. Pois a coisa se agrava quando outro putinho na mesma fila resolve pedir à “queopa” (riu) alguma coisa, mas a dondoca está muito ocupada em fofocar com a congênere desmiolada a seu lado, e o putinho, educado como um peido, insiste, chamando alto e insistente: “Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe! Mãe!”, e a “queopa” (riu) nem aí. Os ouvidos dos outros, segundo ela, devem ser penicos, e os dela, arrolhados para qualquer coisa que não seja fofoca ou futilidade. Enfim, Manoel consegue sair do inferno, e prossegue seu percurso para comprar presentitos para seus (uns mais; outros, menos ou nada) filhos, amigos e para sua amada. E aí começou outro calvário, digamos... torturante. Enter.
Primeiro, conseguir caminhar pelo centro do arraial, em que os brasileiros se amontoam pelas calçadas deixando, entretanto, as lojas às moscas. Se não estão em condições de consumir, de que adianta ficar como bestas olhando vitrines? Pois ficam, e engarrafam as calçadas como gado catatônico, conversando como bobos sem rumo, e ele se recorda daquele conto maravilhoso de Edgar Alan Poe, “os Crimes da Rua Morgue”, em que, diante do primeiro crime, em que o corpo foi encontrado socado numa lareira chaminé acima com a cabeça para baixo, diante da casa se amontoou uma multidão revelando “curiosidade sem objetivo”. E ele se lembra também dos Rougon Maquart, de Zola, em que a marcha da Humanidade é comparada a gado em vagões de trem indo para o matadouro ignorando o que o espera. Pois Manoel escapole dessa turba ignara e consegue parar em frente a uma lojinha de bagulhitos bestas, coisas como bijuterias, bugigangas, perfumetes, essas coisas. Pois no que pára diante da vitrine para ver se algo pode lhe ajudar a minorar a lista de compras, sai célere de lá de dentro uma criatura – mulher, corpulenta, roupas apertadas revelando pneus, jeito másculo, coisas que ele viu num penetrante relance – e já ensaia o ignóbil e asqueroso “Posso lhe ajudar em alguma coisa?”, com que os desesperados vendedores lojistas neurotizados pela obsessão de empurrar vendas – e vivem tentando pegar os compradores a laço – nos assediam. Manoel foge esbaforido, e só ouve, por sorte, as primeiras sílabas da frase cínica. E vai tentar poder escolher algo em outra merda de loja sem que lhe aporrinhem a paciência com essa mania atual de assédio aos consumidores. Enter.
Pois ele encontra outra loja parecida... e adentra. Ao fazê-lo, toca automaticamente uma buzininha. E eis que ali ele tem de ser atendido, pois deseja um produto especial, uma pilha para seu telefone sem fio. A loja, que ele conhecia como sendo especializada em telefonia, só falta agora ser ao mesmo tempo joalheria, cutelaria, armarinho, bazar, bar, papelaria, café, empório de secos e molhados, quitanda, casa de aves e muito mais ainda. Pois nesta a coisa foi especial: estava a loja às moscas; e ao fundo, numa mesita, uma criatura que falava ao telefone ao telefone prosseguiu, ignorando a presença de nosso herói. Deu um minuto, nada; um minuto e meio, nada. Manoel considerou a deselegância e desistiu. E deixou a criatura pendurada ao telefone. Puta merda esses brasileiros! Em cada dez, nove avançam como piranhas sobre suas possíveis presas; uma, simplesmente, ignora o freguês que manifesta estar ali precisando ser atendido. Segundo Manoel vai constatando, uma coisa que desapareceu de vez da cuca dos brasileiros é sentido para as coisas. Enter.
Pois Manoel conseguiu fazer as compras, e chegou o Natal, encontrando-o exausto. Em torno de sua casa, nesse período de vagares, a macacada estúpida volta e meia se reúne para fazer algazarras imbecis, jogar futebol em área não apropriada, apenas parece que essas bestas precisam ouvir o som gritado de suas próprias vozes, porque nada têm a dizer... mesmo que tendo aprendido a falar um português assemelhado com suas bundas, tenham perdido seus rabos e não possam mais voltar às árvores. Exasperado com tanta boçalidade, Manoel enverga fones de ouvido tocando bom jazz e toma uma gelada pra despistar sua contrariedade diante dessa escrotidão que foi transformarem criminosamente uma área verde em espaço de recreio para desocupados e gente sem cérebro nem compromisso com urbanidade ou... ou... cidadania, sinal de uma civilização hoje perdida no passado. Enter final.
“Pois que se forniquem todos! Que se forniquem os corruptos, os simpatizantes e adeptos da corrupção, os pulhas, e que os pobres diabos que tentam viver nesse inferno de hoje, em que nada mais faz qualquer sentido, e em que o não fazer sentido virou o sentido do vegetar desses espantalhos, de boné ou lá o que seja, que estes recebam a piedade de Deus!, porque nada mais poderá ocorrer a favor deles neste sistema de violência em que nos meteram!”. “Ei, o pá!: esqueci-me de que é Natal! Então... feliz Natal!”. E viva Santo Expedito! Oremos. “E que o diabo carregue os estúpidos!”

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Fatos contundentes oprimem um lusitano nas Alterosas

Frederico Mendonça de Oliveira

Desengano talvez não seja o termo preciso, mas é por aí. Não se pode minimizar os impactos sucessivos sofridos por Manoel nas montanhas sul-mineiras, e o fato de eles serem seguidos e fortes realmente faz com que levemos a sério este tão duro percurso. Dá-se que nosso herói não é lá muito apaixonado, a esta altura da vida, por putinhos alheios, especialmente porque os cinco rebentos que ele botou neste mundo já vivem suas vidas pra lá, já existe até uma netinha linda, filha do primeirão, que, sem intenção de rima, vive no Japão. Manoel aboletou-se nas montanhas para poder dar vazão a seus talentos, que ele manteve em suspensão para se dedicar por anos a formar a cuca da turma, preocupado com os “valores” da família de sua ex, do que tomou consciência ao longo do viver conjugal que se deteriorou de forma inevitável. Hoje são águas passadas, e os putos viraram adultos, e, incrível, o sacrifício de Manoel não vingou: os filhos foram “moldados” naqueles “valores” – mas Manoel tem a consciência tranqüila de ter batalhado duro, e considera serem águas passadas, e foi em frente, pois atrás vinha gente. Enter.
A tal pracita toma hoje muito do tempo de Manoel: sem que ele quisesse, a bosta virou uma queda de braço. Alguns mineiros cínicos perguntam, com hipocrisia típica, por que ele estaria brigando com os figurões que fizeram a coisa. Manoel, já emputecido, os manda à merda entre dentes, enquanto responde claramente que não é ele que está brigando contra porra nenhuma, o que acontece é que invadiram-lhe a casa. Os interlocutores safados calam, sem argumento, mas a pergunta de canalhas fica no ar, e a fisionomia dos estúpidos mantém a pergunta, como se a resposta de nada valesse como esclarecimento. Picardia de pilantras, jogo de cínicos, a que o sangue lusitano não se adapta NUNCA! E a degenerescência prossegue, com a vizinhança adaptada ao crime como vermes juntinhos na bicheira, aquele asco. O coração de nosso herói é forte, mas mesmo sem sinais de risco Manoel começa a temer o infarto ou o AVC, tanto lhe sobe o sangue à cabeça. O último incidente foi escrotíssimo. Enter.
Nesta fase de águas dezembrinas, as dondocas que se reúnem com seus putinhos na pracita batiam em retirada para casa com crianças, carrinhos e tudo quando cruzaram com Manoel e o morador mais perseguido na história. Eles chegavam do centro, e a chuva ameaçava cair pesado. Viu que o morador observou feliz a saída daqueles seres, as mães e babás por serem consolidadoras do ilícito ao freqüentar religiosamente o espaço em litígio; os putinhos, por serem instrumentos de uma perseguição torpe e de uma adesão a um crime depravado. Pois uma das dondocas, mais saída, provocou o morador, falando para seu putinho: “Pula, pula! Faz barulho! Faz barulho!”. A revolta subiu à cabeça de Manoel quando viu o morador ser insultado assim, mas não pelo insulto em si: pela deformidade da índole daquela mocréia (embora jovem e até, vá lá, bela), que não hesita em usar seu putinho para causar mal estar ao já idoso morador decente, um legalista que acabou sozinho contra os safados que desfrutam do crime. O pobre-diabinho já é instrumento para os instintos deformados daquela alma desnaturada, usado para causar mal estar contra alguém que não faz mal a ninguém, apenas discorda do ilícito de que a maluca faz uso com cinismo e acinte assumidos! A que ponto chega a estupidez malsã dessa “gente”! “Puta que pariu!”, como disse Graciliano Ramos à página 51 do seu Angústia, edição de 1953, que Manoel leu em Coimbra. Indignado, Manoel verificou a consternação batendo no espírito humanista do amigo, que quedava abestalhado. Enter.
“Terei cervejas no congelador??”, pergunta-se Manoel já preocupado com fazer descer pela goela, com a ajuda de uma geladézima, a afronta daquela criatura de caráter tão deformado. “Ah, tem aquelas que sobraram de domingo!, claro!”, e Manoel se despede do meio esverdeado amigo, cuja coloração se deverá à bile que lhe subiu aos miolos depois da afronta fútil e escrota. E, já em sua copa, a cerveja branca de neve salta para a mesa, e eis nosso herói socando goles goela abaixo, para diluir a estupefação que se transformou em pedra em sua garganta. Enter final.
“Posso ajudar em alguma coisa?”, pergunta a sirigaita a Manoel, que passa os olhos pelas prateleiras de uma loja em busca de uma porcaria de que está precisando. “SIM! PODE! VÁ PRO DIABO QUE A CARREGUE! AJUDAR DIABO DE MERDA NENHUMA! ESTOU A OLHAIRE E SEI O QUE QUERO!! MERDA! PORRA!”, pensa Manoel olhado para a pobre coitada. “Os brasileiros endoidaram de vez!”, resmunga consigo. E viva Santo Expedito! Oremos. “Posso ajudaire em alguma coisa?”

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Desventuras de um lusitano nas montanhas de Minas

Frederico Mendonça de Oliveira

Premido por circunstâncias negativas diversas no arraialito onde se acoitou há 24 anos fugindo das maluquices do Rio, Manoel se decidiu pela radicalização. Consciente do colapso da civilização em todos os sentidos – colapso de significados, de instituições, de condições positivas de vida do homem em harmonia com a Natureza, colapso de sentimentos, de tudo” –, Manoel começa a ver no total desprezo à matéria e ao “convívio social” a única saída para estar vivo neste mundo. A ação dos globalizadores corrompeu as almas dos seres humanos comuns, depois de corromper os Estados através do golpe de misericórdia dos Aliados ao fim da II Guerra, depois vindo Coréia, Vietnam, agora Oriente Médio – Afeganistão e Iraque, sem contar o horror da ação de Israel sobre os palestinos –, e não há qualquer perspectiva de reversão desse quadro. Some-se a isso a ação fatal dos meios de comunicação, câncer que começou com Hollywood operando contra a tradição católica ocidental e se aprofundou quando do advento da TV, que penetrou nos lares para estupidificar os seres e desagregar as famílias praticando acintosa intervenção intradoméstica. Enter.
O quadro é devastador, e Manoel ouve a todo momento o cricrilar espantoso dos Gryllus Assimilis, no Brasil chamados simplesmente de grilos, onde quer que esteja, onde quer que vá. Nas ruas, seres transformados em objetos deambulam flatulentos e paquidérmicos entupindo lojas e calçadas, impedindo o simples deslocar-se de seres conscientes, que ocorrem no cenário urbano em proporção de um para cada dez mil bugres vestidos. Ou macacos sem rabo, como quiser, amigo. Se se pega o telefone para ligar para alguém, o maldito intermediário nos submete a um interrogatório normalmente sórdido, não permitindo a ele escapar de uma sabatina safada tanto quanto absolutamente desnecessária. Entra-se numa loja e lá vem a sirigaita ou o bibazito – e isso ocorre do Oiapoque ao Chuí – arremetendo contra o possível otário para obrigá-lo a desembolsar, perguntando estupidamente: “Posso ajudar em alguma coisa?”, e Manoel por dentro se contorce de desconforto, e grita consigo: “Cínicos! Esses brasileiros não passam de uns cínicos!!!”. Não se pode mais entrar numa porra de loja pra olhar alguma besteira, para ter o prazer de encontrar algo interessante – ou não: muitas vezes entramos numa loja para NÃO COMPRAR, para unicamente ver, com isso buscando apenas uma rápida distração, às vezes para escapar a um congestionamento de bestas palradeiras que obstruem as calçadas. Enter.
Dirigir nas ruas do arraialito, nem pensar. Manoel se desfez de seu Dodge Polara de estimação porque o desgosto de dirigir entre bugres o estava estressando a ponto de perder o sono e tender a beber mais que o natural. Manoel não entende por que, para dobrar uma esquina, os motoristas destas montanhas ficam a 45 graus parados na esquina olhando para um lado e para outro. “NÃO VEM NINGUÉM, PORRA!!, pra que parar dessa maneira, ó pá??? Como é que tu tiraste a carteira, alimária???”. A dificuldade que os arraialeiros de ordinário encontram para conseguir tomar a iniciativa de dobrar uma esquina é semelhante a eles cagarem um velocípede daqueles antigos, de lata – não os rechonchudos velotróis de hoje. O mesmo se dá quando em um cruzamento: se tem placa de Pare, os arraialeiros não param; se não tem, param. O que são os brasileiros? Malucos emburrecidos ou burros amalucados? Lembrando Graciliano Ramos, escritor brasileiro que Manoel leu em Coimbra na juventude – e que os brasileiros de hoje desconhecem!... – na página 51 de Angústia, onde se lê “Que sujeito burro! Puta que o pariu!”, Manoel converte em literatura sua estupefação diante do caos em que se vê metido. Enter.
Certo de que dirigir não dá mais, Manoel se decide por comprar um... burro. Sim: um BURRO. E já sabe o nome que dará ao orelhudo asinino: Excelência. Isto porque o poder no Brasil chegou à dimensão de ter um ser de mentalidade de verdureiro na presidência da República e um bando de quadrupedâncias solertes ocupando toda a esfera de poder – salvo as exceções de praxe, óbvio. “Como pode um país fazer qualquer sentido se conduzido para o abismo por tamanha malta de néscios e velhacos??”, questiona Manoel engasgando com o gole de cerveja. Então, que venha Excelência, uma boa companhia – os arraialeiros e mesmo os locutores de rádio e TV dizem “compania”, os toupeiras –, se considerado o fato de os brasileiros estarem se impondo descer à condição de burros mas conseguindo ser em tudo burros no mau sentido. Pelo menos Excelência não dirá nem fará asneiras, não perguntará se pode ajudar em alguma coisa, não ficará bostejando cretinices no passeio com outros muares obstando o ir e vir de outrem, não dirigirá como um bruaqueiro maratimba, não ficará abestalhado diante da TV assistindo a novelas porcas ou a Sílvio Santos cantando “A pipa do vovô não sobe mais”, canção miserável que o apresentador de merdas fez para um carnaval aí. Enter final.
Então Manoel vai comprar tudo: arreio, baixeiro, freio, cabresto, peitoral, rabicho, e vai alugar um terreno perto de sua casa – tem um quase em frente, cheio de capim – para arranchar Excelência. Melhor ainda: Manoel não terá de pagar IPVA, não gastará combustível, não terá problemas com a manutenção de seu veículo. E andará em alto estilo pelas ruas do arraial, na verdade feitas para quadrúpedes. E pela primeira vez em anos Manoel sente que algo faz sentido em sua vida. A pracita será demolida, mas um burro agora vem a calhar. Excelência lhe fará boa companhia, lhe trará sentido para esta vida entre decadentes assumidos. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Agruras e queixumes de um lusitano nas montanhas de Minas

Frederico Mendonça de Oliveira

"Ora ora!, pois pois!, que os diabos me levem se estou a perder a noção de mim mesmo, ó pá!", vive resmungando Manoel, nosso herói, pelos cantos ou andando pelas ruas abarrotadas de macacos sem rabo andando sem rumo – já que o rumo das árvores para onde essa choldra tende a voltar está perdido, seria perigoso reabitá-las sem apêndice caudal. Manoel contempla os brasileiros vendo-os degenerar não abestalhados ou pasmos, mas tomados de um tipo inconcebível de delícia mórbida... mas desde a criação daquela maldita pracita que Manoel vai considerando que os brasileiros andam a perder sua própria idéia de vida, de tudo. Basta ver os parlamentares e governantes que elegem, vide o maluquete que ocupa a presidência... Enter.
"Gostas de merda, ó pá? Pois estou a chafurdar nela, e não vejo como voltar a Portugal por agora, mas a burrice neste país faz dele um hospício dos mais loucos que possa conceber a imaginação mais delirante!", comenta Manoel como se falasse a amigos, mas ruminando consigo mesmo, vendo as aberrações mais absurdas ocorrendo à solta. Conversando com uma finíssima pessoa sobre a pracita, soube que uma outra pessoa influente nos meios universitários da cidade criticou um morador que vem sendo massacrado por resistir, em nome da lei (!!!), à aberração urbanística. Esta criatura influente dizia a seus alunos que "o morador é meio maluco (por exigir cumprir-se a lei??) e que a pracita é uma belezita, que ficou tão agradável a vista dela tão bem tratadinha"... "Sim, sim", replicou um aluno depois da aula, "mas é ilegal e tremendamente prejudicial ao bairro, à cidade e às instituições, especialmente porque rasga a lei federal que protege o espaço e o faz intocável e porque mija na Lei Orgânica do Município". A tal figura influente desconversou, como convém aos cínicos... Enter.
"Não entendo como os brasileiros podem gostar de se comportar como mulas!", desabafa Manoel em relação a essa figura influente que ou está a desandar a cabeça de seus alunos para agradar a corruptos poderosos ou trata-se ela mesma de um exemplar asinino vestido de belos panos. Ele, que estudou em Coimbra como o poeta baiano Gregório de Matos, não pode esquecer o que este disse sobre o Brasil degenerado já em tempos idos do século XVII: "Adeus, praia; adeus, cidade,/ e agora me deverás,/
velhaca, dar eu a Deus/ a quem devo ao demo dar", recita meio que rugindo nosso herói de fígado amargurado, e a tal ponto que nem uma cerveja brasileira, que dizem ser "paixão nacional" pode aplacar. Condoído por ver o retrocesso social galopante e maligno em que está inserido até dele poder se desvencilhar, Manoel começa a roer a alma. E prossegue lembrando os versos de Gregório de Matos, um dos poucos homens nesta terra que viu e denunciou a merda que o cercava. Lembrou-se do poeta definindo sua cidade, Salvador: o mote é "De dois ff se compõe/ esta cidade a meu ver/ um, furtar; outro, foder"; a glosa é: "Provo a conjetura já/ prontamente como um brinco:/ Bahia tem letras cinco/ que são BAHIA,/ logo ninguém me dirá/ que dois ff chega a ter/ pois nenhum contém sequer,/ salvo se em boa verdade/ são os ff da cidade/ um furtar, outro, foder". E Manoel suspira ao considerar que um autor como este, cuja obra encarta também uma linda parte religiosa em que seus sonetos ao Cristo até hoje comovem com raro impacto, sequer é lembrado no Brasil senão em salas de aula de Literatura, mas que os que o tomam o fazem por obrigação ou interesse material, e logo está de novo esquecido. Que dizer da turba ignara, em que se inserem até mesmo professores e dentistas!... A estes, Manoel, amargando seu exílio, seja local seja em ultramar, declama com fúria o mesmo Gregório de Matos que ele tanto admira: "Adeus, prolixas escolas/ com lentes, bedéis, secretários/ que tudo somado é NADA!". Enter.
E assim se vai preparando Manoel para cruzar de novo – “e sem volta!!”, exclama ele com seus botões – o Atlântico, oceano que os arraialeiros aqui, como ele passou a vê-los, chamam de “Atrântico’, e que mal sabem o que significa, senão que é longe e grande. Como não sabem, os arraialeiros, o porquê de um feriado que parou o país – embora já esteja parado desde 1964 –, mas que os fez trabalhar mesmo assim, e putos da vida, mas obedecendo, para não ficar sem o feijão na barriga depois peidante. O feriado era 15 de Novembro, proclamação da República, que os arraialeiros ignoram, mas que, obrigados a palrar esse nome, dizem: “Pocramação da Repúbrica”. Enter final.
E o coração de Manoel se aperta quando lembra o também poeta Carlos Drummond de Andrade, que verseja sobre o si mesmo desolado pela perda das perspectivas neste Brasil desonrado e desgraçado, da mesma forma que Manoel agora sofre: “Quer voltar pra Minas/ Minas não há mais”. Sofre Manoel pelo sofrimento de Carlos Drummond, que se pergunta “E agora, José?” da mesma forma que Manoel se indaga de si. O oceano azul profundo o salvará? E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té pra semana, babes!

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Agruras de um lusitano nas Alterosas

Frederico Mendonça de Oliveira

"Enquanto o pau vai e vem, o lombo descansa", eis o ditado que Manoel começou a recordar constantemente nas montanhas sul-mineiras, tantas as cacetadas que passou a levar desde que construíram a pracita ao lado de sua propriedade. Educado na cartilha lusa, em que os exemplos para a conduta moral ou para os perigos e as curvas da vida são passados através de ditados (adágios, provérbios) populares, Manoel via que só por isso já estava em severo exílio entre os montanheses no meio dos quais se imiscuiu. Não que aqui não se exerça algo até parecido, embora muito diluído, mas é que aqui a TV assumiu a dianteira da vida social de tal forma que a coisa do ditado, característica e prerrogativa da família, hoje em colapso, não tem nem mais a sombra longínqua daquela solidez, daquela tradição. No Rio, onde passou tempos ouvindo zunidos de balas perdidas e sons de tiros tanto longe como perto, ainda restava algum viço daquela prática, pelo fato de ainda haver muito de lusitanismo na vida carioca, praticado pelos seus patrícios que lá estão – mas que formaram comunidade coesa e à parte, tentando preservar os conteúdos da Santa Terrinha em solo tupiniquim. Enter.
"Tantas vezes vai o gato ao moinho que uma vez lá lhe fica o focinho". Amigo dos bichanos, Manoel desde menino parava pra pensar no gato indo ao moinho apanhar os ratos que viviam ali e um dia, dando bobeira por se sentir seguro demais sendo gato e por se ver à vontade perto do mó, seu focinho lindo leva uma pancada feia da pedra rotativa... mas até que essa história começou a lhe causar certo desconforto: aqui no Brasil os ratos infestam os moinhos do poder, e os gatos, transformados em vilões nesta conjuntura acética brasileira, que parece tudo querer corromper, NUNCA, NUNCA levam a traulitada corretiva a que alude o ditado que abriu este parágrafo. Aqui, gatos e ratos são gatunos, são do mal, e convivem de forma harmônica e a salvo de intervenções do cosmo regenerador, ou das instituições de defesa da saúde social. Enter.
E, falando em gatos, é impressionante os brasileiros serem tão envolvidos com cachorros, parece que virou algo tão indispensável quanto a novela das oito ou o gesto de ligar a televisão. Queres casa? Primeira coisa: providenciar a TV e o (s) cachorro (s). E tanto a TV bosteja seu áudio com aquela tagarelice interminável e caótica quanto os cachorros latem, latem, latem, dias inteiros, horas a fio, parecendo que os dois "equipamentos" são interligados, como que acoplados à vida dos brasileiros e indispensáveis como o poluído ar que respiram (mal, por sinal). Neste exato momento em que são escritas estas mal traçadas, ocorre um comprido estouro de latidos e uivos na vizinhança, trata-se de um canil (proibido por lei em área urbana, mas, e daí? "Foda-se a lei", dizem eles!) a oeste da casa de Manoel, já houve até processo contra o dono, mas o canil está aí, continua, como ainda mais outro, ao sul, que ocupa um terreno inteiro, e nada o erradica. A lei dizia que haver três cães numa casa já configura canil. A Prefeitura ampliou isso para sete, para escapar da responsabilidade de ter de coibir. Pois um dos canis a que Manoel se refere chega a ter mais de 40 cães... e fica por isso mesmo. Os vizinhos que arranquem as calças pela cabeça. E a coisa é pra lá de maluca: "Cachorros, aqui", reclama o Manoel, "são preferência nacional, como cerveja, que os brasileiros bebem como que desejando explodir suas barrigas". Além de existirem cães aos montes a ponto de serem população comparável ou superior à de humanos, existem também os de rua, em grande quantidade, formando outra imensa população. Quando as cadelas de rua entram no cio, vêem-se grupos de dezenas de cães seguindo-as, e o espetáculo que fornecem, combinando a constrangedora cópula e a posterior fase engatada a combates feíssimos, medonhos, às vezes até interrompendo tráfego de veículos em avenidas, é desprezível, beirando, quando não alcançando, o dantesco. E diante disso os mineiros laconicamente comentam: "É complicado!...", e a degenerescência vai se consolidando sob olhares lenientes, condescendentes, até cúmplices. “Eles chamam isso de ‘jeitinho brasileiro!’”, brada Manoel para consigo, implodindo indignação, e nesse momento ele pensa numa cerveja, fazer o quê? Enter.
Mais maluco ainda é o fato de as pessoas que têm gato serem tidas como excêntricas!... Gatos são, até por herança católica de Portugal, bichos de bruxas e capetas. Manoel observa que os brasileiros, por outro lado, não sabem trocar afeto com seres conscientes e assumidos, como são os gatos. Cães são obedientes, quando não subservientes, servis. Gatos, não: sua dignidade felina determina uma relação obedecendo a quesitos de respeito e confiabilidade trabalhada. Para espanto de Manoel, os brasileiros parece que só se entendem sob a égide da subserviência. Aqueles que manifestam sua individualidade assumida são tidos, especialmente pelos mineiros, como “sistemáticos”, até mesmo “criadores de caso”. E como os gatos de Manoel circulam digníssimos pela pracita hetera, motivo de sérias dores de cabeça, eis que os seres que a freqüentam, quase todos tendendo a voltar à copa das árvores que abundam (êpa!) na pracita (parece que não o fazem por terem perdido o rabo nesta “evolução” de milênios por que passaram, ou, melhor, foram passados), lançam para Manoel – e para os mui impolutos e belos gatos deste – olhares de repúdio e desprezo. “Intelijumentos!”, rosna consigo Manoel, já sentindo humores dispépticos, o ácido clorídrico querendo fazer estragos em sua mucosa gástrica. Enter final.
“Tantas vezes vai o cântaro à fonte que um dia se quebra”, vociferava a voz da avó de Manoel, egressa da quase costeira Torres Vedras, ao norte de Lisboa. “Só se quebra se for lá em Portugal”, tritura consigo nosso herói: ele já estava no Brasil quando defenestraram Collor, quando estourou o escândalo dos anões do Orçamento, quando prenderam o deputado Hildebrando Motosserra e o juiz Lalau e sua quadrilha. “Estão todos soltos ou vivendo numa boa!”, impreca nosso portuga, “hoje acontece pior que tudo aquilo, direto, e o cântaro não se quebra!”. Manoel sente-se como Pessoa em seu “Aniversário”: “Sobrevivente a mim mesmo como um fósforo frio”. E lá está a praça cheia de babás, mamãs e seus putinhos. E viva Santo Expedito! Oremos. Ciao, babes!

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Das dúvidas de um lusitano na Pindorama

Frederico Mendonça de Oliveira

Manoel, nosso herói, teve sua juventude marcada pelos progressos admiráveis desta colônia, progressos e conquistas que ressoavam na Santa Terrinha, e ele quedava muito admirado com ver que, mesmo tendo eles o heróico Euzébio jogando pela camisa da seleção portuguesa, o Brasil apresentava outros nomes grandiosos para o futebol, destacando-se a figura do “rei” Pelé, que todos os humanos mentalmente sãos concordam quanto a ser o maior de todos os tempos. Pois naquele mesmo glorioso ano de 1958, tinha Manoel 13 anos e começou a ouvir em rádios de Lisboa uma nova forma de samba muito sofisticada e saborosa, que os brasileiros chamavam de Bossa Nova. Manoel se encantou especialmente com A Felicidade, abismado com os versos de Vinícius de Moraes – lá com respeito a poesia, os portugueses estão muito à vontade, com Camões e Fernando Pessoa como referências –, notadamente aqueles versos: “A felicidade é como a gota de orvalho numa pétala de flor/ brilha tranqüila, depois, de leve, oscila/ e cai como uma lágrima de amor”. “Que deslumbramento, ó pá!!!”, exclamava Manoel para seus patrícios também abestalhados com tanta beleza. “E pensar que foram nossos antepassados que despertaram essa terra com essa gente tão sensacional!!!”, diziam todos, e lá ia mais uma golada de um Dão, de um Porca de Mursa, de um Casal Garcia... com sardinha e tremoços, que ninguém é de ferro também naquela península cheia de encantos. Enter.
Pois a era da canção chamada MPB sucedeu a Bossa Nova, e nomes como Chico Buarque, Milton Nascimento, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gonzaguinha, Ivan Lins e outros produziram uma safra de canções tão admirável que Manoel resolveu vir vivenciar isso in loco, especialmente porque estava muito admirado com o fato de os cantores/compositores/intérpretes brasileiros terem derrubado a ditadura militar, concomitantemente ao surgimento em Portugal do Socialismo da Rosa, com Mário Soares assim assim com os heróis brasileiros da canção. E lá veio Manoel, enquanto a classe média em Portugal se entregava às telenovelas da Globo, o que lhe deu mais alento ainda para sair da terrinha. “Que nós copiemos o que os brasileiros fazem de bom, isso é positivo”, dizia ele; “Mas assim é demais: copiar esse hábito estúpido de entregar nossos cérebros a um aparelho que emite imagens, isso é coisa de silvícolas admirados com espelhinhos!”, resmungava Manoel, já muito bem inteirado das fraquezas de nossos aborígenes, por estudar isso em currículo no curso secundário em Lisboa. Pousou aqui, no Galeão, o guapo Manoel de Oliveira, veio de Boeing 707 da TAP. No cardápio de bordo, ironicamente, arroz de lulas. Enter.
Chegando ao Rio, passeando pela Cinelândia, foi logo assaltado e lhe levaram relógio, dinheiro, passaporte, e ainda deram no nobre alfacinha uns bofetes pesados. O Brasil visto de além-mar, como nosso herói percebeu em curto prazo, nada tinha a ver com a verdade vivida aqui, no seio da guerra civil absurda. Foi a primeira dúvida de Manoel: “Ora, pois! Se existe uma guerra, ela deve ser declarada, e devemos saber quem está de cada lado. Pois no Brasil a coisa é diversa: de um lado, o morro; de outro, a cidade e o poder constituído; o morro não quer tomar a cidade, e a cidade e o poder não querem tomar o morro. Vivem aos tiros e a se matar e ninguém tem objetivo, ó pá??? Estarão malucos ou serão todos uns burros orelhudos??”. E assim se desmontou em Manoel a ilusão que fazem lá fora de um Brasil avançado socialmente, com poetas, artistas militantes derrubando a ditadura militar, ou seja, “flores vencendo canhões”, como disse o cantor Vandré, que depois se assumiu maluco mesmo, e se uniu às Forças Armadas repressoras, até compondo a música “Fabiana” em homenagem à FAB (Força Aérea Brasileira). E assim foi Manoel compreendendo que viver no Rio era perigoso. Mudou-se para as montanhas do Sul de Minas, onde tinha família uma brasileirota com quem se amancebara. E instalou-se na casita ao lado da área onde resolveram fazer, da noite para o dia, uma praça ilegal... Enter final.
Manoel hoje vive o dilema drummondiano: “No elevador, penso na roça/ na roça, penso no elevador”, disse o mestre. Manoel agora vive a contradição: estando no Brasil, está em Portugal; estando em Portugal, tem que estar no Brasil. E enquanto sofre esta dicotomia conflitante, os cães da vizinhança ladram, ladram, ladram, porque os brasileiros, paranóicos e ignorantizados pela TV, querem cães apenas para tê-los, não para conviver com eles. Manoel começa a pensar que os brasileiros descobriram a burrice e a alimentam com estranho prazer. “E os portugueses é que são burros??” E viva Santo Expedito. Oremos. Té mais, babes!

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Desventuras de um lusitano nas alterosas (II)

Frederico Mendonça de Oliveira

Pois o Manoel agora “pisou na trouxa” (expressão que no Brasil ganha diversas variantes: “se retou”, no Nordeste; “virou bicho” ou “chutou o pau da barraca” ou ainda “chutou o balde” no Rio; “queimou no golpe” em Minas, e por aí vai), porque a burrice que reina no Brasil o está fazendo duvidar de si mesmo. Começou com a pracita ao lado de sua casa, transformando um lugar pacato e uma vizinhança em que todos cordialmente se entendiam numa comunidade rachada e cheia de inimizades, em que passou a reinar a cizânia; depois, quando houve reação à praça, os que reclamavam o cumprimento da lei foram processados, tachados cinicamente de “criadores de caso” e passaram a ser moralmente linchados e perseguidos pelos arraialeiros que apóiam a obra ilegal – que transformou uma área verde para preservação ambiental em praça pública, parque de vizinhança e parque infantil, desrespeitando todas as legislações possíveis de serem desrespeitadas. “Que diabo é isto??”, pergunta-se perplexo o nosso Manoel, que se lembra de outros tempos em que o Brasil era respeitado no exterior, especialmente entre os pensadores de Portugal, tempos da Bossa Nova e do Cinema Novo, e veio-lhe à mente aquela coisa do filme “Deus e o Diabo na Terra do Sol”: “O sertão vai virar mar/ e o mar vai virar sertão!”. Enter.
Estava tudo indo numa boa, estava a maré mansa no arraialito onde Manoel se instalara, até que esta aberração que em Portugal causou espécie e hilaridade até em Trás-os-Montes descerrou a cena da absoluta loucura que reina no Brasil. Manoel sabe do que ocorre no Rio de Janeiro, mas acreditava que aquilo era uma guerra civil localizada, da responsabilidade dos traficantes que se opunham ao poder concentrador, uma guerra resultante da discriminação e da marginalização impostas à gigantesca população carente favelada comprimida nos morros, obrigada a se valer de meios ilegais para prosseguir vivendo. Balas perdidas matando cidadãos inocentes, arrastões, massacres envolvendo até crianças, tudo isso não passaria de folclore maligno do Rio, por isso a escolha de um arraialito pacato nas montanhas sulmineiras para viver. Mas a pracita quebrou o encanto, e a maldade se manifestou de forma boçal, e agora fincou-se na cachimônia de Manoel a idéia de ficar voltando a Portugal para esclarecer vários pontos, inclusive considerar, entre seus patrícios, a possibilidade de estar ele embirutando ou começando precocemente a caducaire. Enter.
Pois a maluquice da pracita e a atitude insana dos que a apóiam fanaticamente, como se fosse ela uma bênção recebida de uma divindade, levaram Manoel a procurar autoridades que lhe justificassem a existência da aberração: na verdade, Manoel ficou curioso para saber como uma autoridade do meio-ambiente, por exemplo, explicaria por que não embargou a obra absurda, que causou grande estrago ambiental. E foi numa dessas que nosso herói atentou para a bandeira de Minas, que tem os tão badalados dizeres “Libertas quae sera tamen”. Manoel abestalhou-se: “Puta que pariu! Isto é Virgílio!”. Tendo estudado latim na juventude em Coimbra, a língua-mãe não tem para ele muitos segredos. E ele perguntou ao bacana que o recebia em gabinete refrigerado por que puseram aquele pedaço de verso das Églogas na bandeira de Minas Gerais. O bacana disse que sabia algo a respeito, que nascera vendo a bandeira assim, que ela fora criada em homenagem aos inconfidentes que se revoltaram contra os impostos cobrados pela coroa portuguesa e que estava escrito na bandeira em latim “liberdade ainda que tardia”. Manoel abestalhou-se, quase que abespinhou-se: “Mas isto não é o que está escrito ali, ora pois! A tradução destas palavras é ‘liberdade que, tardia, contudo’, e isto é apenas o começo do verso da primeira Égloga, que no todo é ‘Libertas quae sera tamen respexit inertem candidior postquam tondenti barba cadebat’, que significa ‘liberdade que, tardia, contudo viu-me ocioso quando, ao fazer minha barba, esta já caía branca’”! Enter final.
Manoel saiu do encontro com a autoridade bufando de indignação com tamanha estupidez! Vai ele ao funcionário bacana e constata que até na bandeira de um estado brasileiro escreve-se uma burrice tamanha! Chegou a casa resolvido a tomar muita cerveja para aliviar a putice. Lá estavam na pracita vizinhos com putinhos barulhentos, os adultos olhando torto para ele. E ali mesmo, na copa-cozinha, de caneco na mão, pegou do telefone, ligou para seu patrício que trabalha na agência da TAP em São Paulo e solicitou reserva imediata de passagem para Lisboa. “Ora, pois! Além de burros são malucos, os brasileiros!”, desabafava nosso herói a bebeire a geladíssima cerveja. E viva santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Desventuras de um lusitano nas alterosas

Frederico Mendonça de Oliveira

Pois o Manoel, nosso herói, começou a não entender mais nada do que se passa no arraialito onde fixou residência. Primeiro, faz-se uma pracita num local onde antes existia um sistema de preservação ambiental, e a obra causou um fuzuê dos diabos: uns se aboletaram nos bancos levando cachorro, papagaio, mulher, filhos e netos, fazendo do espaço um prolongamento de suas dependências residenciais, com isso expondo aos outros seus hábitos que deveriam manter dentro de seus espaços; num certo fim de semana penduraram rede entre duas árvores e se ajuntaram como um bando de retirantes, como se estivessem em sua sala de convivência; de outra feita, armaram até tenda de camping para as crianças “acamparem”, levando farnel e o diabo. Pelas manhãs, especialmente aos sábados, reúne-se uma criançada desgraçadamente barulhenta, brincando como um bando de diabinhos enlouquecidos mortificando com gritos finos e altíssimos os ouvidos de seres educados e sensíveis que moram colados à pracita. As babás e mamães que acompanham esses infelizezitos simplesmente ignoram os putinhos, ocupando-se em palrar entre si sobre sabe-se lá que besteiras, que elas chamam de “assuntos”. E como se plantou grama no espaço, volta e meia aparecem malucas e malucos com farnéis e armam piqueniques com toalha de mesa e tudo mais: biscoutos, pets de refrigerante, sanduíches e tal, e a turma dos que são aqui no Brasil chamados de baixinhos se esparrama fazendo algazarra, para estourar os ouvidos dos moradores no entorno. Enter.
E foi aí que o Manoel começou a dar tratos à bola, especialmente considerando que o negócio de os brasileiros dizerem que portugueses são burros não está lá muito certo... porque portugueses não fazem esse tipo de maluquice como a que os brasileiros fazem, coisas como essa pracita. Pior ficou ainda quando o Manoel soube que um prefeito no Nordeste vendeu uma praça pública para um cidadão construir nela seu negócio, por sinal uma lanchonete. E mais impressionante ainda ficou quando deu na TV – que os brasileiros usam como sendo o oratório de suas casas no caso de serem católicos praticantes, o que os emburrece, esta forma de usar a TV, crescentemente, coisa que eles, parece, não notam – que um morador de uma cidade mineira, Juiz de Fora, construiu sua casa numa área verde como a que foi transformada em praça perto da casa dele, fato que deu notícia em âmbito nacional, embora pareça que isso vai virando moda nas montanhas de Minas e fora delas. Danou-se tudo no bestunto de nosso querido Manoel quando foi verificado que, no extremo oeste da área verde que virou praça em seu arraialito, também foi construída uma casa, que toma quase toda a largura do espaço, deixando apenas uma passagem para algum pedestre que por ali se desloque – isto sem contar que no outro extremo, a leste, a área é inacreditavelmente usada como estacionamento de carros para o clube cuja portaria fica bem em frente. Enter.
Queres mais, ó pá? Bem, Manoel já anda querendo voltar a Portugal para comentar sobre tudo isso, só evitando falar com a Maria se os dois estiverem realizando quecas em tardes de cio e vagares. Outra broxada, lá isto não! Mas que tem certeza de que vai fazer sucesso entre seus amigos e circunstantes contando as “modas” do Brasil, lá isto não há negar... especialmente se souberem que os que defendem a lei – não só os que habitam as montanhas onde fica o arraialito, mas no Brasil como um todo – são perseguidos de todas as maneiras, inclusive sendo proibidos de falar sobre o assunto. Haja vinho, bacalhau, sardinha e tremoços para agüentar tanta maluquice!... associada a burrice! Enter final.
Manoel já anda pensando em afivelar as malas e pegar um TAP (Transportes Aéreos Portugueses), companhia que no Brasil chamam de “tamancos aéreos portugueses”, sem contar que até locutores de TV falam “compania”, os intelijumentos – êpa! Já está o Manoel a dizeire que os brasileiros são burros!... –, e cruzaire o Atlântico para ouvir falas civilizadas, já que as últimas experiências no arraialito são de fazer levantar as orelhas de uma besta quadrada. Não se vá atribuir ao Brasil aquilo que não se deve, outrossim: se elegeram Lula presidente, Clodovil deputado e Severino Cavalcante presidente do Congresso, e se Lula está cercado de corruptos que pintam os canecos e ele jura que de nada sabe, admitamos que podemos considerar os brasileiros uns refinados quadrúpedes... embora saibamos que ainda exista vida inteligente entre o Oiapoque e o Chuí – mas isto anda muito escasso!... E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

As desventuras de um lusitano imigrado

Frederico Mendonça de Oliveira

Ainda traumatizado pela disfunção erétil na última queca tentada com sua gentilíssima, alvíssima e rechonchuda Maria naquela tarde invernal em Lisboa, Manuel chegou a sua casita no arraialito entre as montanhas sul-mineiras e encontrou mais problemas ainda que os que deixara ao partir para sua viagem de avaliação urbanística consultando gênios de ultramar na especialidade. Ele, que voltou bastante confuso, agora realmente não podia entender o que pretendem os montanheses no arraial, especialmente por se negar a admitir que se meteu numa região onde crescentemente vai se instalando uma burrice e uma falta de honestidade sesquipedais... e que a grande maioria dos cidadãos adere ao que possa haver de pior em se tratando de coisas que compõem a vida em comunidade. Enter.
Começou a estranheza quando viu que o espaço passou a ser usado, pelas manhãs, como ponto de reunião de amas com fedelhos d'outros ventres, e mesmo com putinhos (meninitos, em Portugal) e as que os pariram de verdade. As criaturas se instalavam nos bancos a conversar e seguramente falar da vida alheia, especialmente das vidas nas casas das patroas – no caso das amas – ou dos problemas das amigas – no caso das mães de verdade. Os fedelhitos, por sua vez, se esparramam pela grama e por entre as árvores a gritaire como loucos, como se estivessem sob a ameaça de tomar uma pica (injeção) no cu (não é chulo, mas lusitanismo para bunda) ou levar pontos sem anestesia em algum talho feio. “Por que diabos estes putinhos gritam como que enlouquecidos de horroire?”, pergunta-se o Manuel com dor de cabeça gerada pela gritaria infantil. Chegou-se ao jardim e perguntou às criaturas adultas se não podiam conter a gritaria infernal dos putos, ao que foi recebido com desdém pelas recalcitrantes, como se fosse um louco inconveniente que estivesse incomodando a alegria alheia. Enter.
Mais impressionado ficou quando uma tarde verificou que chegava um maluquete de baixa estatura – todo baixinho é f*– comandando um bando de adolescentes e trazendo uma montoeira de balões amarelos que foram pendurados nas árvores para dar clima de festa. Demoraram-se por lá horas, fazendo um esporro dos diabos, especialmente porque algumas das raparigas subiam e desciam a passarela de patins, e gritavam besteiras umas para as outras, e aquilo estava virando um inferno. Acabou que se foram, os imbecis sem local para farra, e a calma voltou ao espaço. Dias depois, o mesmo baixinho meio abestalhado chegou com petrechos para brincadeiras, e reuniram-se dezena e pouco de crianças, e o sujeitinho conduziu brincadeiras como corridas de sacos, pique-cola e outras atrações – só que promovendo uma gritaria infernal entre os fedelhos estupidificados pela excitação. Esta sessão de gritarias começou às duas da tarde. Manoel saiu de casa às 18h30 e a coisa ainda estava ocorrendo. Pois Manoel ligou sua guitarra portuguesa eletrificada e tocou fados altíssimo, para fazer frente à algazarra infernal. Quando saiu, foi alvo de troças e acusações. Ignorou e seguiu seu caminho. Enter.
Numa terceira ocasião, eis que numa sexta-feira, chegava ele a sua casa quando verificou que chegava também o baixinho e outro bando de fedelhos todos fantasiados. Manoel gelou, mas ocorreu-lhe de ligar para um advogado amigo a quem tinha já relatado os fatos, e este advogado sugeriu que nosso herói fotografasse a reunião, para possíveis posteriores iniciativas. No que Manuel despistadamente tentou tirar fotos por entre a folhagem de seu jardim, viu-se alvo de vitupérios, insultos, vaias, o que o fez sair à rua e fotografar abertamente o baixote e os fedelhos todos fantasiados. O baixote até lhe dirigiu insultos diretamente, quando Manuel, subindo-lhe o sangue ao quengo, reagiu, perguntando ao baixote, às mães, e a quem pudesse ouvir, se eles não tinham o que fazer, se não tinham casas e se não tinham percebido que o carnaval acabara na quarta-feira de cinzas, que fora dois dias antes. Pois o baixinho e as cabeludas se reuniram num bolo de conluio, houve até quem perguntasse a respeito de o Manuel poder fotografá-los assim. E dissolveu-se a baderna. Enter final.
Semana que vem, mais um episódio de “As desventuras de um lusitano imigrado”, que deve ser lido, para maior desfrute de legitimidade, em sotaque lusitano. E viva Santo Expedito! Oremos, pois. Adeuzinho, gajos e saloias!

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Urbanismo à brasileira*

Frederico Mendonça de Oliveira

Um certo bom português de nome Manoel, vindo lá das bandas de Trás-os-Montes, de onde os lisboetas dizem provir a tão decantada suposta burrice lusitana que os brasileiros gozam há séculos, estando aqui nas montanhas do sul de Minas tentando viveire feliz mesmo que sem o seu bacalhau, suas batatas, seu azeite e seu vinho degustados no clima em que os degustava por lá, deparou com uma certa praça pública que julgou ser algo de outra categoria urbanística que aquela que seus bons e velhos olhos de homem viajado conhecera até estes dias de balas perdidas, outra inovação brasileira que lhe causa certa estupefação. Enter.
Vendo que a tal praça causava uma razoável pendenga na cidade e mais especialmente entre os moradores que a cercam, resolveu dar um pulo a Portugal, mais especialmente a Trás-os-Montes, sua terrinha natal, para investigar se por lá poderia haver algo parecido com a inovadora pracinha daquele arraialito espetado nas montanhas sul-mineiras, especialmente porque o deixou muito intrigado a discórdia que cercava o inusitado logradouro em questão. Afinal, se agora estava envolvido com a terra para a qual emigrara, seria de bom alvitre que nada nesta sua nova condição de cidadão ficasse sem explicação razoável, e uma pesquisa pela Santa Terrinha de Portugal poderia pôr fim a este tão estranho enigma encontrado nas montanhas alterosas em que agora vivia. Enter.
Nada encontrou parecido por lá, nem na linda e velha Lisboa de outras eras nem nos diversos povoados que percorreu em busca de dar com os olhos em algo naquele estilo sul-mineiro. Pois ocorreu-lhe realizar uma pesquisa do tipo que os brasileiros chamam de ibope. Passou a indagar a seus amigos ibéricos a respeito da curiosa obra urbanística, e logo o admirou que falar da pracinha, descrevendo-a de início apenas por suas características, provocava reação semelhante com quem quer que ele falasse: primeiro, uma estupefação associada a incredulidade; logo em seguida, uma explosão de gargalhadas muito parecida com as que sucedem as piadas que contam no Brasil sobre seus patrícios. Pois deu-se que, no percurso de sua pesquisa, a questão se alastrou entre seus congêneres lusitanos como uma nova e impagável anedota, coisa que mais e mais muito o admirava – ele não entendia a razão de tanta hilaridade, pois apenas pesquisava uma característica urbanística sul-mineira, não uma excentricidade tal que levava os conterrâneos portugueses a tal reação. Enter.
Pois já começando a arrumar as malas de volta para o arraialito em que agora residia nas montanhas sul-mineiras, resolveu, para ver se entendia de forma clara e eficiente o enigma de falar sobre a questão causar tamanha espécie e tanta explosão de risos, buscar aconselhamento íntimo com a sua velha namorada Maria, com quem promoveu na mesma alcova de outros tempos uma sessão flash-back sobre alvos lençóis de linho perfumados de alecrim, e, claro, ambos em trajes de Adão e Eva... Enter.
A primeira foi ótima, e eles fumavam entre arrulhos com saudades do passado e já se iam excitando para a segunda quando nosso Manoel lembrou de abrir a questão antes de partirem pra nova queca (em Portugal, assim eles se referem ao ato de fusão de corpos). Pois eis que a Maria o olhou espantada e pediu que ele explicasse melhor que diabo era aquilo. Ele então falou, a contragosto e já meio que bufando de desejo, que “fizeram uma pracinha, no arraialito onde ele agora residia, que não tinha ruas em volta dela, uma pracinha que estava diretamente ligada às residências que a cercavam, e que os moradores se dividiram, uns contra e outros a favoire, e que por causa da pracinha saíram processos na Justiça e debates encarniçados no jornalito local que fez reportagem sobre a inovação, que quase saía porrada e que deu até censura a um certo moradoire tido como o encrenqueiro por não aderir ao cordão dos puxa-sacos” e tal. Enter final.
Maria explodiu em gargalhadas, e nada a fazia parar, e mais ria ainda ao ver o Manoel e seu bigodão enfeitando a cara chapada de estupefação, e mais ainda ao constatar que fora-se a excitação do parceiro, cujo membro caíra em disfunção erétil, encolhidito, e assim se encerrou a pesquisa do tipo ibope brasileiro que nosso Manoel foi fazer em Portugal. Voltou pro arraialito, e lá estavam a praça e a pendenga, e ele soube que o tal moradoire encrenqueiro jogou em protesto óleo queimado nos bancos da praça, e que nova polêmica acirrada rolava no jornalito local. Manoel ainda se perguntava por que seus patrícios riam tanto e por que o assunto tinha virado, na Santa Terrinha de Portugal, uma nova e palpitante... piada de brasileiro. E viva Santo Expedito! Oremos. ’Bye, babes!
* - Leia em sotaque lusitano, para melhor compreensão e efeito

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

A barafunda é o estado normal das coisas

Frederico Mendonça de Oliveira

Semana de festejos de aniversário de um arraial do sul de Minas, e lá vêm os ícones da mídia de merda, indústria de bugres aos milhares por dia, “animar as festa”. No cardápio, pagode, breganojo e pop asinino. Em suma: imbecilidade em dose pra elefante nenhum ficar por perto. Assim querem os globalizadores: que sejamos o país – país?? Porra nenhuma! Isso aqui é apenas hoje um lugar, aliás quinto dos infernos!! – da imbecilidade generalizada, a barafunda onde os boçais sejam o padrão médio da população; sob eles, os mais boçais ainda; sobre eles, os menos boçais um pouco. E assim se estabeleceu a semana de festejos do arraial das Bagas, o município onde a corrupção é legalizada e festejada. Enter.
A população pobre simplesmente entupiu a praça central, onde os boçais cantantes, simples cavalgaduras canoras, apresentaram sua titica musical para semblantes abestalhados de tamanha estupefação midiática a que foram condenados. Um motoqueiro que fez entrega em minha casa disse que a praça estava tão cheia que não passava nem papel entre os presentes, de tão duro de gente. Falou isso com estupefação, como a questionar tamanha acorrência, e fiquei eu pensando com meus parcos botões sobre se isso tem reversibilidade algum dia. Enter.
Não, queridos incertos leitores: NÃO TEM MAIS. Para que tivesse, deveria ou descer dos céus um Cristo que não se deixasse mais crucificar e mandasse todos os cães globalizadores para um campo de concentração no inferno... ou que o tal planeta Xis viesse mesmo, não ficando só na profecias de Nostradamus e citações no Evangelho, até da letra cantada (??) pela patética e sesquipedal Cássia Eller. Porque depois que os seres são abestalhados, reduzidos a intelijumentos ou a macacos sem rabo, não há como desabestalhá-los. Enter.
Será essa aí a humanidade do Cristo? Deus nos livre! Adoradores de maratimbas e cajetilhas estúpidos (que por sua vez crêem mesmo que MERECEM o que lhes pagam e dirigem de idolatria) não podem mais, pelo menos nesta vida, retomar a consciência, porque já foram drogados por esse ópio maligno ao âmbito da irreversibilidade do estrago em alcance físico, mental e espiritual. Auscultei a abissal voz do povo, que hoje é a voz do diabo em todas as suas manifestações: Babalon, Belphegor, Baphomet, Mefistófeles, formas do mal em abomináveis entidades, e o que ouvi foi a sonoridade deletéria dessas manifestações infernais. Dizer que os que deambulam pelas ruas hoje são pessoas é no mínimo exibir doença mental: pelas ruas hoje circulam macacos sem rabo – que por terem perdido o apêndice caudal não conseguem mais voltar às árvores –, objetos vestidos do Sistema, bonecos palradores repetindo fórmulas verbais de que não conhecem o sentido. Como disse Lima Barreto lá pra 1915, “Se nós tivéssemos sempre a opinião da maioria, estaríamos ainda no Cro-Magnon e não teríamos saído das cavernas”. Pois voltamos a elas, sim senhores. A abjeção e a degradação chegaram a tal profundidade que andar pelas ruas hoje dá medo, mesmo em pacatos arraiais sem balas perdidas como este, que trouxe para seu aniversário de mais de cem anos três manifestações da mais refinada boçalidade que a história da canção brasileira registra. È pra sentar no meio-fio e chorar de... de... INDIGNAÇÃO DIANTE DE NOSSA IRREVERSÍVEL IMPOTÊNCIA DIANTE DE TAMANHA CANALHICE E DEPRAVAÇÃO INSTITUÍDAS EM TODOS OS SENTIDOS POSSÍVEIS E IMAGINÁVEIS!! Enter final.
Pois é aqui mesmo que se rasgam as leis, se defeca no direito dos cidadãos, se cospe na cara de pessoas dignas. Essa história já andou publicada, mas deixa isso pra lá, porque, embora Xenofonte defendesse que “as bestas se amansam com delicadeza”, me dou o direito de discordar disso, porque ele viveu tempo de bestas de quatro patas; hoje elas têm só duas, mas não há delicadeza ou violência que as detenha... porque tomaram o gosto da deformidade, do diabólico, do imundo, de tudo quanto possa haver de degradante e de porco! Em suas veias torpes corre pus, e só podemos pedir a Deus por essas monstruosidades vestidas que habitam a superfície do planeta neste lugar desgraçado e miserável chamado Brasil, “um país de todos”... os que forem patifes, canalhas, degenerados e imundos de alma e espírito. Bom proveito, cães degeneradores e seres amestrados por eles: a lei de ação e reação está em curso. E por mais que nos doa profundamente ver tudo isso, adeus!!! E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té mais, babes!

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

A morte de um gênio esquecido

Frederico Mendonça de Oliveira

Minha orquestra de violões e guitarras vai trabalhando comigo e
aprendendo coisas que jamais sonharia saber não fosse esse convívio
tão opositivo: eles quase todos teen, eu sessentão. Minhas aulas não
se limitam a fórmulas musicais e técnicas instrumentais e/ou teorias e
teorices: estuda-se a música em seu todo, sua evolução, sua
essência, estuda-se a vibração básica e essencial, a gênese do
som, a nota no espaço - quando passa um carro ou uma moto emitindo
uma nota, paramos para localizar a nota, o mesmo quando a cadeira
arrastada emite um som musical - e tudo que se relacione com música.
E adjacências, claro: a política mortífera imposta à música real e
a grana monumental investida nas formas sonoras miserabilizantes, desgraçantes,
regressivas e patogênicas. E foi numa dessas que lembrei Dorival Caymmi,
que morrera há dias. Enter.
Pois é. NINGUÉM sabia quem era Dorival Caymmi. Bem, dá pra entender:
são jovens perdidos num turbilhão de merda midiática e que só têm
referência de um passado musical recente pelo que pais e avós
mencionam, ou pelo que ouvem de viés, acidentalmente. Pois tratei de
cantar as coisas do velho Dorival para a turma, tudo garotada em torno
e abaixo dos 15, e foi assombroso ver como eles se abriram para a
realidade musical brasileira daquelas canções admiráveis que
trouxeram a Bahia verdadeira para o Sul ainda Maravilha. Impressionado
mesmo fiquei eu ao perceber que houve, por parte de adolescentes
púberes, grande assimilação daquela maravilha. Foi incrível cantar,
envenenando pesado a harmonia no violão e para pares de olhos vidrados
e profundamente atentos, canções como Dora, É Doce Morrer no Mar,
Marina, Suíte dos Pescadores e mais outros detalhes disso e daquilo,
inclusive lembrando Amazon River, do filho mais velho de Dorival, o
gênio Dori Caymmi, que vive coo que exilado em Los Angeles há mais de duas décadas.
E daí deu pra explicar coisas esquisitas como o completo
desconhecimento de um homem de tamanha estatura musical e da absurda
negação, por parte da mídia maligna dos globalizadores, de espaço
para trabalhos geniais e grandiosos como o de Dori Caymmi, o filho
ungido do velho baiano e um dos mais importantes compositores modernos
brasileiros, que figura no topo de nosso cancioneiro desde que este
existe como tal. Enter.
Pois é: o velho foi-se com quase 100 nas costas. Declinou
biologicamente, desfez-se deste corpo material com o qual viveu muito
bem tantos anos, e deixou este puteiro, de que falou Cazuza, com sereno
distanciamento, mas levou consigo toda a magia da Bahia que ele soube
ensinar aos brasileiros. Levou com ele as ondas verdes do mar, os
coqueiros e areias de Itapoã, a água negra do Abaeté, o vatapá, o
caruru, o munguzá, as moças do Jaguaribe que choravam de fazer dó,
porque a jangada que saiu com Chico, Ferreira e Bento voltou só... E
saiu sob uma incelença para entrar no paraíso, dando adeus aos
irmãos "'té o dia do Juízo". Enter.
O Brasil até foi cortado pela notícia, deu até durante um jogo de
vôlei da seleção do Bernardinho, com Giba e tudo, mas soou como um
pé de vento num deserto. O Brasil está desgraçadamente esquecido de
si, vitimado por uma alienação maligna, aquilo que era nosso povo é
hoje uma legião de quase duzentos milhões de zumbis... É que vigora
hoje a noção de que amar a pátria ou tê-la como valor é grave
perversão. "A burguesia fede", letrou o pobre Cazuza, mas falou
certo: a burguesia responde pelo estraçalhamento de nosso país e de
nossas vidas, porque ela é a classe dominante completamente curvada e
servil aos interesses dos globalizadores genocidas. Quanta
abjeção, quanta podridão, quanto excremento lançado sobre um povo
indefeso! Enter final.
O corpo do velho Dorival foi velado e enterrado no Rio, mas deveria ser
mandado para sua querida terra, teria de ser velado e enterrado na
Bahia, claro, como seu conterrâneo e contemporâneo Jorge Amado.
Estiveram ao lado de seu corpo uma meia dúzia de palermas da canção
brasileira, enfeiando a saída do grande ícone. Dori, que veio de Los
Angeles para enterrar o pai, soltou os cachorros nessa podridão toda
que vivemos. E não poderia ser diferente: deve ter doído em seu
coração de gênio ouvir os políticos falando de seu pai, desde a voz
roufenha e asquerosamente cínica de Lula até os César Maia da vida
bostejando asnices sobre algo que definitivamente não alcançam, mas
que até desprezaram sempre. Dori falou tudo - mas a mídia dos cães
deletou. É que a fala dele é pra gente, não pra zumbis. E viva Santo
Expedito! Oremos. ?Té a próxima, babes!

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

A música foi pro saco, e sem volta

Frederico Mendonça de Oliveira

Além de soterrada por formas sonoras deletérias e desgraçantes para mentes e espíritos, a música vai sendo esquecida e somente resguardada em guetos de onde jamais ressurgirá para desfrute da população em geral. É a instalação do império do Cão, tarefa que já teve como pontos de referência a crucificação do Salvador e a bombas atômicas em Hiroshima e Nagazaki, mais as intervenções no Afeganistão, no Iraque, mais o enigma das Torres Gêmeas (atentado atribuído à Al Qaeda, mas seguramente praticado pelos mesmos seres abissais que difundem o horror desde tempos imemoriais contra o cristianismo e contra as nações soberanas), tanto quanto o lançamento de todas as formas deletérias de prostituição das artes, da filosofia, do mundo cristão, e que hoje ressoam no Brasil através da explosão de Alcântara, dos atentados contra os vôos 402, 1907 e 3054 e outros, sem contar a explosão da P36, lembrando que esses cinco fatos que enlutaram o povo brasileiro FICARAM SEM QUALQUER EXPLICAÇÃO, revelando a sordidez e o sadismo genocida que por trás das cortinas orienta o despedaçamento do nosso agonizante Estado, e com o apoio de nossos “governantes”, lacaios dos globalizadores. Enter.
Isso rima com as letras dos petardos torpes “entoados” – seria mais correto dizer “excretados” – pela fauna do axé e quejandos, de que lembramos trechos calhordas: “E eu aqui, pulando, suando, cantando”, tanto quanto recebe sob medida a trilha sonora do breganejo que fala “Ela só qué coisá, só qué coisá” e tal. Pura matéria excrementícia para embalar a destruição de toda e qualquer instituição saudável dentro do corpo ainda vivo da já massacrada música brasileira – que já esteve, em tempos recentes, entre as mais importantes manifestações artísticas populares de todos os tempos. Basta dizer que Garota de Ipanema é a faixa que obteve o maior número de gravações da história da música popular no mundo. Enter.
Vamo coisá, gente? É o que resta, enfim, para os que ou entregaram seus cérebros e vidas aos ditadores do mundo, ou que tiveram seus cérebros e vidas suprimidos pela ação de intervenções desagregadoras que têm sido lançadas ininterrupta e febrilmente contra todos nós. E o pior é que a música foi transformada em instrumento prostituidor de mentes e espíritos, já que foi prostituída para essa finalidade. As legiões de seres que pulam e emitem sons guinchados diante de dupras e de “bandas” de axé, aliás legiões que somam milhões e milhões, muitas dezenas de milhões, são o mais importante material usado para impedir que a música real volte a circular. Está tudo tomado, senhores. E tudo isso tem um exemplo monstruoso como ilustração para a barbárie que já se manifesta justamente através das formas submusicais. Só quem tem conhecimento específico na área do que resta da música pode confirmar essa ação de bárbaros contra nossos pensadores musicais resistentes, dos mais humildes aos mais provectos guardiães do nosso conhecimento musical. E vale relatar essa ignomínia que todos endossam sem saber que apóiam um massacre fatal que mensageiros dos globalizadores praticam contra nossos remanescentes na área da música. Enter.
Em São Paulo, os donos de casas noturnas onde se reúnem seres em recreação não musical, ou apenas tendo bonecos fazendo “música ao vivo” como pano de fundo para conversas ocas em extremo padrão de alienação, oferecem seus espaços para músicos tentarem exercer sua função: tocar. Ou tem o boneco de violão tocado como a cara dele e “entoando” sucessos da malfadada emepebê ou tem a turma do instrumental tentando desesperadamente tocar, ou seja, executar em público seu conhecimento adquirido através de dedicação a estudos de forma sacerdotal. As cacatuas vestidas, desmusicalizadas até para além das pobres próprias almas, falam pelos cotovelos enquanto rola a função. Mas essa função tem um conteúdo porco, que passo a relatar encerrando esta sessão. Enter final.
Os donos de casas noturnas oferecem seus espaços aos músicos e aos menestréis da titica emepebística e quejandos. Só que cabe aos interessados em tocar e/ou cantar a responsabilidade de mobilizar público para ganhar através dos couverts (as bestas pronunciam “covér). Detalhe canalha: a casa arrecada 20% do total desses couverts. Não demora e estaremos tendo que pagar cachê à casa noturna para tocar. Melhor que isso, gente, só Lula de porre dizendo que “Há males que vêm pra bem” em pronunciamento público sobre a explosão em Alcântara, que matou TODA A NOSSA COMUNIDADE CIENTÍFICA AEROESPACIAL, JAMAIS ANTES REUNIDA NA BASE PARA COISA NENHUMA. Se você gostou, ou se não, o jeito é oceis coisá. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

A desgraça esmaga a música brasileira

Frederico Mendonça de Oliveira

Um supermercado faz promoção em dois dias seguidos na semana e põe,
entre outras “atrações” típicas de macacos sem rabo, um
”músico tocando e cantando” num espaço entre duas prateleiras de
bagulhos. Boçalíssimo. O pobre tem teclado que faz tudo, ele só
coloca voz naquela tarefa de cantar sucessos para ninguém. E os
seres-objetos vestidos vão comprando, sem sequer se dar conta de que um
pobre diabo canta para “alegrar”, para “animar”, produzindo uma
”música ao vivo” que poderia ser chamada de “música à morte”,
”música moribunda”, “música terminal”. É como o cego tocando
saxofone velho na calçada, e completamente esquecido de quem passa
atrás de suas vidas. Miséria típica de uma sociedade cínica e
depravada que exclui, deforma, transgride, massacra, concentra, tudo
isso e muito mais. Nossos parabéns aos demônios que operam o golpe de
Estado internacional, nossos parabéns a Roberto Marinho lá no outro
lado, e a seus substitutos, seguidores e a sua legião de mais de
centena e meia de milhões de lacaios cultivadores de hemorróidas e
estupidez e que apodrecem sob o plimplim maligno e devastador, esquecidos de si e da vida concreta que Deus lhes deu. Enter.
O músico hoje é um desgraçado consciente. Para tocar seu instrumento,
tem de suportar a exploração criminosa, canalha, sórdida, imunda, dos
donos de “casas noturnas”, antros de estupidez, futilidade (ou
”putilidade”?), exibição e consumo de ignorância assumida em
mesas de alegria parecida com a de hienas, encheção de rabo com
comidas e bebidas, todos mastigando e ingerindo, ninguém ou quase
ninguém se dando conta do que estaria sendo tocado pelos menestréis
de merda de hoje, “animadores” da estupidez assumida e coletivizada
em buracos usados por gente sem rumo e sem pátria, tudo para amenizar a generalizada boçalidade assumida e trazer a público o estrago feito pelos “meios de comunicação”. Enter.
Os donos desses antros de estupidez manifestada onde se apinham seres de mente oca e alegria falsa comendo e bebendo são gângsteres sem máscara. A instituição do “couvert artístico” (que muitos chamam de “covér”), invenção de outros tempos para pagar músicos mas que hoje assume a dimensão do contrato de prostituição e da mais deletéria caftinagem, fez do músico uma excrecência viva, comparável ao mais baixo nível de prostituição. Primeiro, os festivais desde a década de 50 deram às platéias de leigos o direito de opinar sobre canção e mesmo música – neste caso, para providenciar a eliminação da instituição musical em prol de promover somente a canção de mercado –, e o resultado disso foi a fase de emepebê e a posterior instituição do império da merda musical, iniciada pela lambada de Luís Caldas e pelo breganejo urbanizado dos asiáticos Chitãozinho e Xororó, além da invenção do pagode pasteurizado, tudo gêneros cancionísticos festivos e alienantes, patogênicos e regressivos, tudo para transformar o ouvinte brasileiro em imbecil consumidor de merda sonora. Depois, detonada e eliminada a música, veio a fase do músico medíocre usando voz e violão em casas noturnas para cantar miseravelmente “sucessos” desse mercado de excrescência cancionística desde décadas para cá. E eis criada a maligna e miserável “música ao vivo”, caracterização do crime contra a música e da consagração da boçalidade em relação promíscua entre leigos cantantes e repertórios chinfrins e público de cavalgaduras alheias a qualquer tipo de valor musical – que dirá artístico. Enter final.
Os donos de casas noturnas, quase sempre piratas safados e deformados cientes de sua criminosa pilhagem contra os músicos, enriquecem às custas destes. Por exemplo: cobram R$ 5 por cabeça de freguês, e não raro passa dos 200 pagantes de couvert (ou “covér”). Dá uns mil por noite, fácil extremamente fácil. Pois o canalha paga R$ 250 ou, em certos casos raros, até R$ 300 aos músicos – e embolsa criminosa e cinicamente o restante. Usurpação clara, crime frio e premeditado. E na cara de pau: se houver protesto, a substituição é imediata, pois não falta quem queira assumir a vaga, e assim despencam os valores da noite, e o músico descontente ainda sofre discriminação em outras casas, tendo até de mudar de cidade se quiser prosseguir músico. O crime compensa na atividade puteada da “música ao vivo”. Voltaremos a isso. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Histórias que escapam aos pobres seres de hoje

Frederico Mendonça de Oliveira

Esse negócio de dizer que atentar contra a cultura de um povo é atentar contra a identidade dele não é balela coisa nenhuma. Pode haver algum macaco sem rabo assumido como objeto vestido que ouse “questionar”, ou “contestar” – o que não muda muito... – pelo simples fato de não ter a mínima idéia do que possa ser cultura, menos ainda o que possa ser identidade de um povo. Macacos sem rabo sentam seu traseiro anuro no sofá e entregam seu destino à TV, e acham isso divino: não precisar pensar é uma dádiva para os que se animalizaram por comodismo, sem esquecer uma forte dose de cinismo nisso. Há também os que, por serem responsáveis por esse atentado, caguem comodamente suas regras e conduzam qualquer discussão sobre o assunto para o abismo em que nos mergulharam a todos nós. São os globalizadores torpes, a quem só interessa desnacionalizar tudo e impor sua própria nacionalidade tribal rígida e uma lei implacável. Pois é. Vamos em frente. Enter.
Acordei outro dia pensando numa canção linda que o Cauby Peixoto gravou em 1958. A modernidade musical já se fazia presente em muita coisa, especialmente pelo trabalho de gente como Lindolpho Gaya, Radamés Gnatalli, Chaim Levak, só pra citar a turma do Rio que ia vestindo a música de maneira diversa do quadrado seresteiro. Acontecia paralelamente o “fenômeno” Maysa, que não passava de um tremendo golpe globalizador anticatólico, e sobre isso falaremos ainda. Mas acordei pensando na linda “Viver sem Você”, de autoria de Fernando César, que aliás emplacou 178 canções gravadas, todas de altíssima qualidade composicional. A canção citada é um beguine, e sua estrutura encosta em termos de qualidade em coisas como I Love You ou In the Still of the Night, jóias da produção do maior compositor americano de canção, Cole Porter – aliás, tarado por beguine. Fernando César seria o Cole Porter brasileiro, e não por querer sê-lo: acontece é que desde sua estréia compondo para Ângela Maria, em meados dos anos 50, deu pra ver tratar-se de um mestre. E a linda Viver sem Você é até registrada nos Google da vida, mas ficaremos sem saber a letra, a menos que tenhamos sorte; ouvir a gravação original, de Cauby, só por milagre; saber quem fez o arranjo para orquestra, só se Deus der uma tremenda mão nessa história. Mas eu tinha 13 anos, já estava pra lá de enfronhado na beleza musical via rádio – ah!, bons tempos!... – e já detectava a grandeza do trabalho dos músicos brasileiros por trás das vozes de plantão em trânsito para a modernidade, que seriam Nelson Gonçalves, Dóris Monteiro, o próprio Cauby, até o Ivon Cury, sem contar a maravilha que era ouvir Núbia Lafayette, com suas tristes e lindas baldas de amor não correspondido tratadas por uma voz emocionada e afinada por Deus. A podridão já avançava, mas ainda tínhamos escolha. Enter.
Maysa estourou com Ouça, faixa que na verdade retrata a vitória do mundanismo sobre um tradicionalismo católico: ela era casada com um Matarazzo, da família paulistana que recebia o papa aqui e era recebida por ele lá. A campanha para o escândalo contra os Matarazzo foi movida pela Manchete, revista dos Bloch, gente nada nada católica. Não que seja fundamental ser católico, nada disso; o que vale foi que o gol sofrido pela estrutura de cultura católica ainda em vigor naqueles dias foi irreversível, e Maysa foi um instrumento. “Ouça, vá viver a sua vida com outro bem/ hoje eu já cansei de pra você não ser ninguém”, faixa introduzida por uma abertura orquestral de cordas simplesmente sublime, entrou como uma avalanche na família brasileira, e seguramente desde então as separações ganharam força, tendo como exemplo a mulher de olhos de gata casada com um aristocrata e que bebia, fumava e cantava contrariando e até mesmo afrontando com ousadia os ditames da grande família tradicional católica Matarazzo. E logo depois Maysa se confirmava intérprete de peso com a obra-prima Meu Mundo Caiu, com introdução também avassaladora, com um trombone – se foi gravada no Rio, o trombonista terá sido o Norato – solando em êxtase uma partitura braba, e as cordas arrebentando em ousadia harmônica, coisa que as batatas de sofá de hoje ouvem sem detectar qualquer valor, muito menos qualidade ou beleza. Enter final.
Tenho pena dessa pobre gente de hoje, sob a fala entoada e tão medíocre de Ivete Sangalo, resultado de uma seqüência triste iniciada por Betânia, vindo depois Gal e Simone. Mas Deus sabe o que faz. Só que as coisas se esgotam. E hoje a feiúra é o tom da vida que nos impingem. Recordar é viver, pois. E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té mais, babes...

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

A passagem de um homem da Justiça por Alfenas

Frederico Mendonça de Oliveira

Pelo início do século passado – é tão curioso dizer “século passado” quando parece que ele está tão perto, e quando “século” sugere 100 anos... mas vá – veio de Uberaba (por aí, há confirmar) para Alfenas um promotor de Justiça de nome João Evangelista Barroso. Deve ter vindo pela mão de Deus, como sempre acontece, para que se cumprisse o que estava escrito, como costumamos ler no Novo Testamento. E eis que o próprio não fincou raízes, como de costume na carreira funcionários da Justiça. Mas conheceu uma moça por quem se afeiçoou, e isso não é proibido pelo código que rege a conduta, direitos e deveres desses servidores. O nome dela era Angelina Rezende, que passou a assinar, depois de os dois contraírem matrimônio, como era de se esperar, Angelina Rezende Barroso. Enter.
O promotor logo foi transferido para outra cidade, a já meio longinha Ubá, lá pro lado da Zona da Mata, aqueles por assim dizer cafundós, por onde o degas aqui já andou dando guitarradas acompanhando o saudoso Moleque Gonzaguinha. Isso foi lá pra 1983, pelo inverno. Tocamos para um show de colégio, coisa assim, e a coisa era estranha: diante do palco, mesas com abajurzinhos e bufê sendo servido, coisa atípica em shows daqueles tempos. Lá ao fundo, de viés, uma arquibancada íngreme entupida de uma moçada ruidosa, excitada, que promovia uma gritaria dos diabos enquanto tocávamos para uma “seleta platéia” comendo e bebendo em suas mesas. Tinha até um de terno e gravata, um ser curioso que nos recebeu com perguntas a queima-roupa, do tipo militar, quando chegamos à tarde para montar o palco. Esse ficava bem de frente, como se o show fosse pra ele. Mas algo me intrigava naquilo tudo: havia uma pergunta no ar... Enter.
Ubá parecia uma comunidade atrasada, estranha se comparada a todas as localidades por que passávamos. Talvez pela estranheza do local onde tocamos, pelas mesas, pela gritaria da juventude empoleirada lá na arquibancada ao fundo e de lado. Mas algo nos intrigava, e não sabíamos exatamente o quê. Quanto a mim, farejava algo diferente naqueles dias em que já me acometia o mal-estar de participar daquela fase nada musical em que o Gonzaguinha, já estourado no “gosto” do povão, fazia aqueles shows só pra cumprir agenda fechada antecipadamente, mas já sem qualquer interesse, pois ele já galgara o olimpo da emepebê. Enter.
E tocamos, e depois veio um jantar numa biboca acanhada, e voltamos de Ubá para o Rio no carro do Gonzaga, o Maranhão dirigindo, e o carro de repente apagava as luzes no breu das estradas daquelas bandas, em que placas apareciam indicando a proximidade de uma certa “Picas”, cidade que parece servir de referência de entroncamento na região. A cidade era Bicas, só que os malucos arrancavam a barriga inferior do “B” de sacanagem, coisa de que os brasileiros tanto gostam. Enter.
Mais de dez anos depois, eis que um amigo me presenteia com um LP duplo gravado em homenagem a um dos nossos maiores compositores do... século passado. Lendo o texto interno da capa dupla, deparei com a história do tal promotor, que teria vindo do Triângulo, passado um período em Alfenas, onde se casou, e ido transferido para Ubá. E ali estava a coisa de que eu desconfiara em Ubá. A cidade era algo com que eu tinha uma conexão, por saber que dela viera alguém importante PARA MIM. Pois isso merece um parágrafo à parte, embora ainda possa dizer neste que a surpresa foi dupla, porque eu resido em Alfenas há 23 anos e acabou que tomei conhecimento da questão justamente aqui, onde se terá dado o fato marcante que agora passo a revelar. Enter final.
Lá vai: já em Ubá, depois de se casarem em Pomba, o casal gerou um filho, de nome Ary, e sobrenome Barroso. Sim: Ary Barroso. Aquele mesmo, que depois compôs Aquarela do Brasil, aquele que compôs Na baixa do Sapateiro, No Rancho Fundo, Na Batucada da Vida, Aos Pés da Cruz, Pra Machucar meu Coração, Maria (“o teu nome principia da palma da minha mão”) e outras maravilhas hoje absolutamente soterradas pela avalanche de miséria sonora cancionística com que os globalizadores nos presenteiam direto e reto. Nossa geração, que já vai entrando pelos sessenta e que viveu os tempos do grande Ary, vai saindo de cena, e vai ficando aí uma outra coisa, uma outra gente, para quem isso é nada, passado remoto e sem sentido. O Brasil agoniza. Uma nova “humanidade” vai entupindo a superfície de um país extinto. Essa nova gente nada sabe de nada. Eles vão pagar a conta... E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té mais, babes!

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Uma tarefa doce e algo sofrida

Frederico Mendonça de Oliveira

Em 1958 Maria Ignez Senne Costa, sob o pseudônimo Maricene Costa, participava do primeiro festival de canção no Brasil, aquele Voz de Ouro ABC. Não me lembro qual a canção vencedora, mas lembro de ter o Guerra Peixe metido nisso. Ela ganhou o troféu, e vem cantando desde então, mesmo sem ter integrado a banda olímpica da MPB, ao lado de Simone, Betânia, Gal, e de cantoras de verdade como Elis, Fátima Guedes e Nana Caymmi. Ficou na raia paralela, vem gravando discos de quando em quando, e não deixou nunca de ser cantora, mesmo que, como gente de sua época e de sua praia – Alaíde Costa, Ana Lúcia, Claudette Soares, por exemplo – esteja completamente fora da chamada mídia. Bem, sabe-se lá o que pode um ser que não está programado geneticamente para acontecer nesta vida, mas é interessante verificar o que pode determinar o sucesso ou a obscuridade. Enter.
Lá vai o velhote jovial aqui acompanhar Maricene no CD em que ela reúne temas da bossanova paulista. Neste 2008 temos visto muito falar da Bossa Nova, movimento genuinamente carioca, mas a contribuição de São Paulo não pode ser esquecida, especialmente porque dela saiu coisa de muito peso para nosso cancioneiro. Maricene, que talvez grave pela última vez nessa iniciativa, foi a primeira cantora profissional que acompanhei quando iniciei minha participação no cenário da canção moderna brasileira. Estávamos no Teatro Santa Rosa, Rio, em 1969, eu tinha meu quarteto vocal denominado Quattuor, e estava lá esperando a hora de entrar e cantar. De repente, chega o Menescal e me pergunta se eu poderia acompanhar uma cantora lá, que estava sem quem a acompanhasse. Topei de cara, especialmente porque ele me dissera ser a Maricene, que eu já conhecia de nome. Fomos lá, simpaticamente nos apresentamos a nós, à música e ao público musical que ouvia tudo embevecido. Nem me lembro o que foi, mas saiu nos trinques. Enter.
Veio logo depois o boom da MPB, e tudo mudou. De repente, em 71, topei com ela em São Paulo e acabou que combinamos um show “Maricene Costa e Som Imaginário”, eu na direção musical e nos arranjos para o grupo, que eu integrava como guitarrista e compositor. Foi lindo, cenário do espetáculo Balcão no Teatro Ruth Escobar, algum público respeitável... mas já ia tudo se dissipando. Depois nos vimos em várias, sempre amigos, sempre de olho um no outro. Aí gravei com ela em 82, estive com ela em show solo na Sala Funarte, Rio. Depois, em 97, eis que me aparece a querida Mariça, como a chamo, no lançamento de meu livro na Funarte-SP, com direito a Paulinho Nogueira, Fauzi Arap, Mutinho, Osmar Barutti e o velho e parece que imortal Fernando Faro, o Baixo. Puxa, que turma boa pra uma chopada ou uma noitada no velho de guerra Piolin!... Depois disso, apenas lembro dela sempre, minha irmã de paralelismo musical, amicíssima, uma alegria como gente do peito. Enter.
Pois eis que há poucos dias me liga a Maricene, depois de conseguir meu telefone com o Osmar Barutti, e me convida para aquilo que pode ser o melhor registro da Bossa Nova paulista. Foi um encanto, e eis-me aqui nos arranjos para o disco a ser gravado semana que vem. Lindas canções: Mantiqueira, do Nelsinho Ayres, que aconteceu extemporaneamente na voz de Walter Santos; Ilusão à Toa, de Jonny Alf; Menino das Laranjas, do Théo de Barros; Menino Desce o Morro, de Vera Brasil; Dá-me, do Adilson Godoy; e Tristeza de Amar, lançada pela inesquecível Alaíde Costa. Estou preparando tudo, depois a internet faz o resto. Afinal, mercado fonográfico já era, música instituída já era, o que vale agora é a macacada ligada na net. Enter final.Ouvindo o CD com os originais que a Mariça reuniu, eis que pela primeira vez na vida senti que minha hora chega. Antes, um belo dia, doeu no coração saber que Luís Eça, Edson Machado, Tom Jobim e tantos outros nomes já se foram. Agora é diferente: senti uma estranha saudade desta vida que ainda percorro. Nostalgia, talvez seja isso a tal da nostalgia. Mas estou preparando esse registro, e me sinto muito feliz de escoltar Maricene Costa no estúdio, e seguramente teremos bom registro – até porque, no encontro que tivemos semana passada, ela se mostrou pujante no gogó, e de minha parte cabe a segurança de anos de estudo me garantindo a forma como... violonista!, já que na verdade sou é guitarrista... Mas todos verão e ouvirão. Sorte, Maricene! E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Globalização, o inferno assumido

Frederico Mendonça de Oliveira

No arraial onde me maloco a distância segura de balas perdidas e da guerra civil que pesponta o dia a dia das capitais, o inferno também se faz presente com clareza e até requintes. De início, as instituições estão estraçalhadas também aqui, onde se verifica a existência de uma comunidade que pratica o estelionato moral na maior cara de pau, como se isso fosse o bom senso. Um poder recheado de corrupção escancarada prossegue no poder a despeito de iniciativas saneadoras, que esbarram simplesmente no... poder! As instâncias desse degenerado poder brasileiro – ou , muito mais precisamente falando, anti brasileiro – se protegem por corporativismo DE PODER, a bem de manter mamando quem está mamando, e essa corja se manterá corja enquanto der pra se manter, ética e princípios de honestidade e probidade às favas. Então acontece que desde Brasília, passando pelas capitais e chegando aos mais insignificantes arraiais, o poder é corrupção, isso ditado pela capital do País, a mais hedionda e asquerosa bicheira já constituída desde que Cabral trouxe a turma de além mar tendo em seu seio um globalizador de carteirinha. Ou você pensa que globalização é movimento “moderno”? Ora, babe, tome juízo: não é com o rabo na poltrona e “ligado” na Globo que você vai ficar informado da verdade dos fatos. Enter.
Então vemos que as “sociedades” hoje não passam de gente corrompida vivendo ao sabor da correnteza e virando as costas pra tudo, inclusive para a própria evolução. E justamente no arraial onde me escondo da barbárie constato a deformação social explicitada em simplesmente quase tudo. Por exemplo: passa por aqui regularmente e fica na cidade por uma semana um imenso caminhão Volvo do tipo trio elétrico (que era o trio de guitarra, cavaquinho e percussão que tocava de cima de um caminhão no carnaval de Salvador, o trio de Dodô e Osmar, portanto o “trio los dos”; e os instrumentos eram eletrificados, novidade para a época), todo cheio de luzes neon e tendo uma carroceria com dois andares tipo uma barca do São Francisco, onde se apinham imbecis para um passeio pelo arraial. Quatro palhaços acompanham o caminhão pelas ruas, pulando e dançando ao ritmo maligno que o veículo emite, normalmente disco music, axé e até o créu. Essa desgraça ambulante inferniza as ruas da cidade durante uma semana, desfilando um episódio de anarquia estúpida francamente permitido pela comunidade, que se revela um bando de obedientes ao cabresto da Globo. Se alguém protestar, será perseguido, como vem acontecendo com os que ainda se preocupam com fazer valer a lei e os princípios da cidadania. O veículo se define como “mega trem da alegria”, mas alegria só terá quem embolsar o dinheiro dos otários que pagam e embarcam estupidamente nessa miséria itinerante. Enter.
E assim vai tudo se misturando: o diabo do caminhão agora fez parceria com um supermercado que, em troca de fazer a publicidade com cartazes afixados no veículo e projeção de som com ofertas dos produtos da casa, paga a passagem da “petizada”, essa legião de futuros paus mandados a serviço dos intervencionistas de todos os tempos. Então a coisa se embaralha mais ainda, misturando cu com bunda e disseminando o caos, que já se manifesta em tudo: só falta ter loja de conveniências em ônibus e metrô, televisão nos banheiros públicos pra nego defecar vendo a Globo – boa idéia pro cocô, talvez – e anúncios de tudo em uniformes de serviços públicos. Enter final.
Fui a Sampa de busa, e lá estava a TV nas fuças dos passageiros, passando um filme boçal de trapalhadas de um certo Mr. Been, ou Bean, sei lá. Interessante é que só um passageiro parecia olhar pr’aquilo. Cinema na TV no ônibus. A merda avança. Falarei mais sobre isso, também sobre cinema, flagelo desde sempre. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

“Rapsódia em brulho”

Frederico Mendonça de Oliveira

Acredito que algum dentre meus possíveis leitores conheça Rapsody in Blue, célebre composição de George Gershwin, por sinal amigo de Ravel, de quem ele tirou muitas idéias musicais para várias de suas composições – que são digamos respeitáveis, mas que sempre ficarão à margem do verdadeiro mundo erudito, talvez porque... porque... digamos a verdade: porque não eram verdadeiramente canônicas. Na mesma época, Villa Lobos embasbacava o mundo, e era considerado gênio pelos mais importantes nomes do erudito mundial, sendo copiado descaradamente por Stravinsky, só pra citar um exemplo cavalar. Mas Gershwin, se tinha algum talento para orquestrar, se tinha suas idéias para a constituição de um material americano que o mundo aceitasse, na verdade ficava aquém do patamar necessário para sua inclusão entre os mestres. Não alcançava nem mesmo gente como Camargo Guarnieri e Francisco Mignone, que dirá o Villa. Bem, mas a que vem esse gringo neste texto? Enter.
É que a tão famosa – à custa de muita promoção dos meios de comunicação controlados pelos congêneres de Gershwin – Rapsody in Blue anda sendo promovida no Brasil, aliás Brisêu, ou Brizêu, justamente por um de nossos redutos de erudito, a Petrobras Sinfônica, orquestra criada pelas mesmas mãos responsáveis pelo naufrágio da P36 e por vários outros “acidentes” ocorridos na Petrobras (mais acidentes que em toda a história da empresa somados) quando da gestão inexplicável de um certo Henry Philip Reischtul, gringo que não poderia ser presidente da empresa mas que foi, porque, para a consecução de tal fato, mudou-se o primeiro estatuto da empresa, que rezava que o presidente da Petrobras só poderia ser um brasileiro nato. O tipo citado era naturalizado. O que fica sem resposta é por que tinha de ser ele o presidente, por determinação inarredável do teratológico FHC, a quem o povo brasileiro agradece pelo câncer que se instalou definitivamente sobre nós. Enter.
E pela segunda vez, pelo menos que o velhote aqui saiba, a Petrobras Sinfonica toca o tal gringo Gershwin: uma, parece que para sua inauguração e apresentação ao público – ou púbrico, como dizem nas montanhas de que desceu o “maestro” Wagner Tiso, que “regeu” o concerto de apresentação do conjunto, com Gershwin no repertório. A turma ficou sem entender que patacoada era essa: por que não executar Villa Lobos ou outro de nossos gênios sob a regência de um maestro legítimo? Por que tal factóide? Bem, a orquestra foi iniciativa do tal Reischtul ou coisa que tal – não sei o que sabe ele de música ou de orquestra –, e o factóide musical WT era então entronizado nessa “boquinha” para fazer música popular brasileira. Ué... então por que Gershwin? Mas o Brizêu é isso mesmo: surrealismo. Enter.
Pois nestes últimos dias eis que o “maestro” atacou de pianista e cometeu, sob a batuta de Isaac Karabchewsk (nossa, quanta consoante!), a mesma Rapsody in Blue, para delícia de... quem mesmo? A quem interessa isso de a Petrobras Sinfônica ficar tocando Gershwin? Alguém se habilita a explicar? Pois rolou a coisa, para espanto de muitos, especialmente dos músicos da orquestra, que saíram da folia globalizada comentando entre eles, à boca solta, que aquilo não foi Rapsody in Blue, mas Rapsódia em brulho, tal a embrulhada cometida pelos inábeis dedos do “maestro” pop eruditóide ao pianol. Enter final.
Isso é Brasil, gente: tantos maestros aí – inclusive com admirável material de composição –, afiadíssimos e aptos para ocupar cargo de maestro e regente da máquina em questão, e a turma aturando patacoadas... E viva Santo Expedito! Oremos. Inté!

sábado, 16 de agosto de 2008

Notas sobre um Brasil surrealista

Frederico Mendonça de Oliveira

Bar Bossa Nueva, Vila Madalena, São Paulo, 13 de agosto de 2008. Só faltava ser sexta-feira... Começando a “festejar” 40 anos de uma carreira que engordou contas bancárias de fariseus a serviço de multinacionais da canção e que me valeu apenas menções em dicionários especializados em música e registros vários mundo afora e na internet, eis-me tocando com um grande amigo, o brilhante pianista Osmar Barutti, e com músicos outros, como eu desconhecidos do grande público. Osmar é exceção: aparece naquele hoje infame programa do Jô toda noite, mas não enverga o traje das celebridades filistinas que se julgam olímpicas porque ungidas pelos globalizadores. Aos outros cabe a obscuridade dos zé-ninguém, mas em essência, sensibilidade e conhecimento destoam do triste amontoado humano que deambula a esmo e entope os espaços sociais, espaços, na verdade, socioterminais... Bem, tocamos pra gente grande, isto é, pra nós mesmos. Os presentes até piraram de ver, pois é para eles impressionante contemplar as maluquices que fazemos com os instrumentos, mas o teor musical não é assimilado por NINGUÉM exceto, no caso daquela noite 13/08, pelos ilustres presentes Zé Rodrix e Tavito, meus velhos companheiros do hoje usurpado Som Imaginário, mas eles entenderam tudo unicamente porque são músicos também. Ninguém fora músicos assimila nada, porque o abismo entre a música e o público de hoje é irreparável. A desmusicalização do Brasil é incurável, irreversível, assim também a dessocialização e a desidentificação nacional. E nos resta prosseguir, em nome de Deus. Enter.
Puxa!, que paragrafão! Tive de reler! E temos de tirar o chapéu para os globalizadores, porque conseguiram habilmente, com precisão de relojoeiros suíços, transformar preciosidade social em merda pura. Quem conheceu o Brasil de Villa Lobos, Ary Barroso e Tom Jobim não valorizava nem mesmo Chico Buarque e quejandos da MPB, porque na verdade para estes a música era já TOTALMENTE RELATIVA, o que os condena sumariamente diante do tribunal da música. A MPB, ou emepebê, foi tarefa de multinacionais, ou coisa de globalizadores, com a participação de colaboracionistas como os já citados emepebistas, e aí é que a vaca Brasil foi pro brejo. A canção de hoje, desgraça liderada pela patética Ivete Sangalo, paradigma da ignorância sorridente premiada pelo sistema, e por figuras sinistras como Daniel, Leonardo, as duplas do miserabilizante e cancerígeno breganejo e por DJs e tantas outras deformidades que animam o oceano dos ímpios e da miséria sonora, é matéria em plena decomposição. O ambiente que cerca essa prática regressiva e destrutiva rima totalmente com outro ajuntamento, para o que reservo o parágrafo conclusivo desta sessão de avaliação do que sofremos nestes tempos pré-apocalípticos já escatológicos, e nos dois sentidos conhecidos. Enter final.
Entro na loja de 1,99 para comprar sacos de terra vegetal para minhas plantas – aqui dizem ‘prantas” – e eis-me integrando, como um extraterrestre, o gado humano global. A ralé vivendo o consumo, eis a maior ironia de todos os tempos! Não podendo se desfazer dos fedelhos para “ir consumir”, os bugres fazem da loja um pandemônio, seguramente a reedição do palácio de Satã, de Milton. Os fedelhos berram e fazem birra porque também querem consumir porcarias, e seus rústicos pais e mães, rudes e toscos, não se importam com o caos que produzem, para eles coisa normalíssima. Os seres abissais entopem os corredores entre prateleiras de quinquilharias e bugigangas enquanto seus rebentos berram e choram alto. A “música” de fundo não poderia ser outra: “dupras” de breganejo emitindo ganidos e gemidos lancinantes. Pensar em Deus numa hora destas é até risco. Só resta fugir em busca de ar... E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té mais, babes!

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

A Civilização Brasileira acabou-se

Frederico Mendonça de Oliveira

Não, não é o que vocês estão pensando: refiro-me à EDITORA Civilização Brasileira. daí as maiúsculas. Pois é: outro dia li, para não perder um amigo, um artigo da Folha – que os comunistas do extinto MR8 e hoje editores do jornal Hora do Povo chamam de “a cloaca da Barão de Limeira – assinado pela Bárbara Gancia, por sinal glamurizada, pela multidão de lacaiso dos globalizadores, como grande e sensata pensadora em meio a esta barafunda letal que enfrentamos. De cara ela deu uma tropeçada no penico, esparramou mijo no soalho: ela acredita na “mentira do século”, está por fora da mais importante realidade de nossos tempos desde 1945. E fala da coisa com a emoção da indignação de quem sabe o que aconteceu em Acosta Ñu. Pois ela começou falando já estar se achando meio velha, porque não acredita mais na civilização, coisa que em outros tempos a gente achava que um belo dia ia encontrar ali na esquina. Ela pode estar ficando velha sim, como todos nós, se não morrermos prematuramente, ficaremos, estamos ficando ou já ficamos. E a civilização já acabou sim, dona Gancia, trata-se de um fato, mesmo que a senhora seja colunista da tal “cloaca” também glamurizada como sendo um oásis em meio ao despedaçamento final. Puxa, vamos em frente, senão isso vira nariz-de-cera... Enter.
Mas a Civilização Brasileira acabou, e isto é trágico. Perdemos tudo neste país, e este é um feio sinal. Quando cursei Letras na Universidade do Estado da Guanabara, hoje UERJ, a Civilização publicava livros aos caminhões, numa qualidade jamais vista, e em todos os aspectos, desde as capas do Eugênio Hirsh até a participação profusa de pensadores em simplesmente todos os aspectos. Nessa época, a Eldorado Tijuca, uma das maiores livrarias do País, não tinha espaço nem prateleiras pra abrigar tamanha produção editorial: ficavam pelo chão pilhas e mais pilhas de livros recém-chegados, tudo cheirando a novo: as livrarias teriam de dobrar de tamanho para comportar tamanha demanda. Hoje, ora, “hoje”!... “Hoje” é a merda! As livrarias só têm porcariada, os tais dos best-sellers dos globalizadores ocupam quase todo o espaço, além da enxurrada de produção de auto-ajuda, sem contar o paulocoelhismo escatológico balizando os parâmetros da ignorância global generalizada. Enter.
“Hoje” é a merda. Estive no Rio tempos atrás e fui a todos os grandes sebos da “cidade maravilhosa” hoje cidade pavorosa, não precisa dizer por quê. Em nenhum deles achei um Iracema (!!!). Do Guimarães Rosa, só um Sagarana, que adquiri, claro. Do Campos de Carvalho, neca. Aliás, ninguém dos sebos sequer o conhecia. E o Campos de Carvalho foi publicado completo pela Civilização, com capas memorabilíssimas do já citado Hirsh: A Lua Vem da Ásia, Chuva Imóvel, Vaca de Nariz Sutil, O Púcaro Búlgaro eram livros do Brasil ainda brasileiro, com um belo contraponto na obra de João Antônio, também publicada pela Civilização, inclusive o Malagueta, Perus e Bacanaço. Eram tempos, não essa merda desse “hoje”. É carma coletivo, claro, e carma brabo, hem?! Que diabos andamos fazendo no passado para viver uma condenação dessas, caraco?? Será que fomos nós que afundamos a Atlântida e condenamos os atlanteanos a morrer afogados e devorados por predadores marinhos, a maioria dos infelizes habitantes do continente perdido boiando e tentando salvar mulheres e crianças da voracidade de dragões marinhos, polvos gigantes, tubarões e orcas? Enter final.
A Civilização acabou, porque aliás acabou a civilização. Resta-nos as degustações das boas coisas que alegram os que não morreram mentalmente sob a Grobo, resta estudar e progredir em meio ao caos, resta pedir a Deus pelos desvalidos. ’Tá russo, também ’tá ruço! E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Pra não dizer que não falei de...

Frederico Mendonça de Oliveira

...flores. É, também falo dessas coisas, que passam desapercebidas de tantos seres neste mundo. Beaudelaire escreveu “As Flores do Mal”, que não li, mas o título se fixa com facilidade. Parece que ele falou das papoulas do ópio, que são mortais, mas deixo para ele ou para quem quiser o trabalho de ler sobre algo que só nos destruirá se for usado por nós. As flores que me interessam são as do bem, as rosas, as orquídeas, mesmo as margaridas e as simplórias mas tão alegres tagetes, por aí. Também me interessam as flores que brotam das notas de Bach nos prelúdios para cravo nos lindos adágios do Cravo Bem Temperado. Epa!, estou bancando o intelectual, falando de coisas que os que se deliciam com flores do mal podem considerar maluquice de eruditóide! Enter.
Quando tenho de sair da toca, onde me refugio deste mundo a cada dia mais medonho e horrendo, sou obrigado a ouvir as flores sonoras do mal. Onde quer que haja comércio, lá está uma caixa de som despejando “sucessos”. Agora temos flores do mal até na feira, onde se instalaram caixas de som tocando obscenidades e gratuidades ao âmbito da estupidez para “animar” os que compram e vendem hortaliças, secos e molhados e tudo mais. As letras do “sertanejo” da programação desta detestadíssima e até detestabilíssima “rádio feira” são tétricas, coisas como “só qué coisá”, referência a uma personagem mulher que apresenta furor uterino. E tome falar de festa que tem muita “muié”, “as muié”, e volto pra casa com essa escatologia zoando na cabeça, e ela só passa quando ponho pra rodar algo sonoramente digno, construtivo, saudável. É terrível considerarmos que o mal avança a galope, e o bem se encolhe em seu canto mais e mais, cada dia mais, com medo, com vergonha, com imenso espanto. Enter.
Os objetos ambulantes e vestidos do sistema se engalfinham nessa massamorda social em decomposição e causam medo. Sim, porque eles dão continuidade, como mensageiros irracionais, a toda a deformidade imposta pelos globalizadores, e ai de quem levantar a voz contra todo esse horror. Uma amiga bancária se queixava, outro dia, de ter de passar todo o expediente ouvindo uma maldita caixa de som da loja em frente, sempre em liqüidação e sempre projetando som miserável de “sucesso” na rua. Pois agora parece lei: todas as lojas – maneira de dizer, claro – estão pondo essas desgraças na porta, e temos de suportar conviver com isso, e sem reclamar. Se reclamamos, lá vêm aqueles olhares de espanto estampados em semblantes asininos, como se estivéssemos revelando que encoxamos a própria mãe no tanque ou que batemos nela com porrete por causa da mistura. O que essas criaturas defendem? A desgraça que adotam contra si e que querem ver difundida mais e mais? O que será desses seres que praticam um suicídio que lhes é proposto pelos globalizadores através dos “meios de comunicação”? Virarão zumbis sem referência da vida, de si e de Deus? Enter.
É, tudo se encaminha para uma calamidade atroz. Os elefantes se afastaram com sábia antecedência do local onde ia rolar o tsunami. Aqui, os humanóides do sistema se apresentam ávidos para o abate mental, moral e espiritual. Só resta orar por eles, que são a esmagadora maioria nesse cenário cataclísmico. Não, não devemos chorar sob o cobertor, isso é para fracos. Devemos peitar isso, e basta, para tanto, refletir sobre a própria lucidez resistente e seguir de cabeça erguida por entre a multidão mesmerizada pelas forças das trevas, flores do mal. Enter final.
Flores, sim, comecei falando delas. Estou com lindas orquídeas sapatinho no xaxim. A despeito da demência instalada em torno, elas florescem e embelezam, e gostam do jazz que estudo sempre; senão, murchariam. E encerro com uma fala especial: “bem aventurados os bêbados, porque verão a Deus duas vezes”. Significa dizer que é bom estar fora do que é considerado normal. “Publicam viam ne ambules”, isto é, não ande por onde anda o vulgo. E viva Santo Expedito! Oremos. ’Té pra semana, babes!