sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Manoel e os micos no comércio

Frederico Mendonça de Oliveira

“Posso ajudar em alguma coisa?”, pergunta cínica e/ou abobada a sirigaita empregada em qualquer loja em que se entre. Numa dessas, Manoel, embaraçado, responde educadamente que não, ao que a criatura acrescenta, com estudada falsidade: “Fique à vontade”. “Puta que pariu!, caraco, puta merda!! Eu já estava à vontade! Entro no diabo da bendita loja e nem posso olhar para as titicas expostas, lá vem a maluquete ‘instruída’ pelos psicopatas do comércio tirando-me o direito de olhar as merdas sem ser incomodado ou, pior, estorvado!! Que miséria, que dislate, que MICO!!”, vocifera Manoel para suas profundezas emputecidas pelo assédio agressivo no comércio impudente. Sentindo-se realmente assediado pela doidivanazinha, Manoel foi ao Houaiss, e lá está um dos significados do verbete estorvar: “tolher, impedir (liberdade de movimento, livre trânsito etc.). E é isso que ocorre atualmente “na avidez doentia no mundo das lojas”, segundo nosso herói. “Não se pode mais olhar porcaria nenhuma em lugar nenhum!!! Entramos para olhar!, comprar será escolha nossa, porra!!!! Ou não pode??? Poooooooooooorra!!!”, desabafa indignado o mais brasileiro lusitano nessa Pindorama desvairada. “Estão todos loucos, ó Maria, e parece gostarem, e obedecem como zumbis acéfalos, já se preparam para o próximo patamar, qual seja, o de voltar às árvores, seguramente o lugar de onde vieram...”, e Maria já se reta e engatilha sua ira santa quanto à conduta dessas pobres atendentes, na verdade umas metediças, e vem chumbo. Enter.
“São umas infelizes, ó Manoel! São coitadas tratando de se agarrar à tábua de salvação que é o emprego, decerto um subemprego perverso... Sei até de vexames por que passam essas infelizes! Um dono de loja aqui no arraial, por exemplo, volta e meia obriga suas funcionárias a dar pra ele nos fundos da loja para não despedi-las. A miséria moral desse meio é tal que elas sucumbem a tais horrores para manter colocação nesse inferno, pois inferno pior, para a maioria delas, será aturar desemprego! Então podemos entender que obedecem a tudo para se manter ‘colocadas’. Mas, vejamos: não são só moças: rapazes, embora não tenham de dar para se garantir, também assediam de forma escrota... mas... vamos à origem disso, ó meu caro? Afinal, para tudo existe uma causa, certo? É batata que isso é só ponta de iceberg!”, e os olhos firmes e pestanudos de nossa heroína se alojam belos nos de nosso herói. Enter.
“Falaste e disseste, ó Maria! Pois não é que outro dia, na caixa do supermercado, estando atrás de mim um monte de gente com carrinhos, ouvi da atendente, depois de receber o troco, a absurda pergunta: ‘Mais alguma coisa?’, e fiquei atônito, perdido. ‘Como assim?’, perguntei, sentindo o silêncio de uns cinco na fila atrás. Pois a garota travou, só pôde insistir mecanicamente na pergunta, já em pânico. ‘Você tem alguma sugestão?’, perguntei, tentando sair do impasse. Pois a garota ficou em total embaraço, aturdida. A fila parada, lá, aguardava. Apiedado diante da merda mental da infeliz, ajudei: ‘Não, é só isso.’, ao que a pobre respirou aliviada, voltando à irracionalidade que lhe garante o salariozinho seguramente uma titica.”. Maria contemplava o ar, imaginando a cena besta, “vendo” a bobalhona em colapso mental, e insistiu: “As causas disso, Manoel, as causas! Se EM TODAS AS BOCAS DE COMÉRCIO ACONTECE ASSIM, algo move isso, trata-se de uma ação planejada, posta em prática em plano sistemático, e essas pobres criaturas acríticas obedecem como gado, em aquiescência vacum, são objetos e engrenagens de um programa!”, conclui Maria com inflexão aquilina em seus olhos firmes e belos. Enter.
“Ah, ó Maria, veja que mataste a charada! Pois não é que, dia desses, uma bela operadora de caixa me revelou isso?! Ante a piada de um amigo a respeito do infame ‘posso ajudar em alguma coisa?’ com que nos otarizam direto e reto de uns tempos pra cá, a moça nos desvendou o mistério enquanto operava o troco: ‘Ah!, é o treinamento da Associação Comercial! Eles treinam a turma pra agir assim!’. Fiquei chapado, ó linda, porque apareceu o rabo da onça, a prova do crime! Tens razão, eis a origem! Trata-se de um que os pobres acéfalos aprendem a impor ao cidadão! As associações comerciais, por sinal instituições de origem obscura – o que está por trás disso, que não sabemos? – e de inserção suspeita no contexto social, sempre operando de forma intangível e obedecendo a uma instância silenciosa e cheirando a secretismo, seriam as responsáveis por essa deformidade perversa?! Seriam?? Bem, a moça não falaria pelo rabo, pois estava sentada sobre ele, obstando um possível discurso do traseiro... mas, cacilda!, que achas disso??”. Enter
Maria assumira um teor pesado no semblante, uma seriedade combinando entendimento com indignação. “É o que eu dizia, ó Manoel... tem carne por sob esse angu, como dizem por aqui. A maluquice está na deterioração premeditada das relações, coisa estudada, a estética da impertinência. Hoje constatamos uma caotização de conteúdos... E vem a calhar você tocar no assunto dessa relação absurda e absolutamente inaceitável para quem pensa ou sente um mínimo que seja, e ouvir as ‘razões’ que ‘eles’ lhe apresentam, razões deformadas, de golpistas assumidos, de contraventores profissionais. Assim como garotas têm de dar para o patrão no fundo da loja pra prosseguirem empregadas, da mesma forma são investidas na tarefa de estorvar os fregueses. Pois é: Criticam Hitler diariamente há mais de 60 anos mas ele continua aí, destruindo tudo... Não é mesmo? Hem? Hem?” Enter final.
“A verdade, Maria, é que vamos chegando ao limiar de uma era. Vai se formando uma Babel no planeta, não há como fugir. Eles avisam: ‘Causaremos tal desordem entre os povos e dentro deles que, no dia em que tomarmos o poder através do golpe de Estado internacional, todos beijarão nossos pés em total gratidão’ (!!!), é ou não é isso? Se hoje falamos do surrealismo no comércio, em que o consumidor já vive direto sob atentado contra sua identidade, personalidade, privacidade, seu direito de ir e vir e direito de escolha, puteado sob perguntas impertinentes, como se fossem incapazes de decidir e de escolher o que lhes convém, de saber discernir entre o que interesse ou não, imagine-se isso daqui a alguns anos... Bem, quem sabe de si não cai nessa, mas a boiada perdida na vida está sob esse jugo, e a coisa só fará piorar. E as associações comerciais? Piam a respeito dessa política escrota e maligna? No mínimo dirão que ‘não sabiam’, parafraseando certo ser abissal de voz roufenha e de caveira sempre ‘cheia de alpiste’, ou talvez digam o que dizem os que seguem a orientação delas: ‘Se você não atende o freguês, ele reclama!’. Ora, como dizem lá na Terrinha: ‘Vão lavar essa bunda!!!’, pois vocês enganam é os trouxas, gente que já deixou de ser gente!”, brada nosso herói sob a aquiescência de sua linda Maria, que já arma outras abordagens especiais pra frente... E viva Santo Expedito! Oremos. Té pra semana, babes!

Ah! Vale lembrar que estamos sob censura desde 11/04/08, e que a restrição já vai totalizando 897 dias. Abraço pra turma do Estadão, que também atura isso há 441 dias...