quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

O Natal dos desesperados

Interrompo o trabalho sobre os “acidentes” aéreos que nos impingem com a maior cara de pau para falar de outro “acidente”, este também com aspas, mas porque é acidente provocado há milênios, e que agora chega ao que poderíamos chamar de estética do proletariado perdido. A feiúra que perpassa esses patéticos momentos pré-natalinos, que de natalinos não têm mais nada senão vagas lembranças, causa dó misturado com uma forma estranha de estupefação, isso partindo de corações e mentes ligados na triste realidade que contemplamos. O resto, o povão, a massa, a macacada, ah!, esses estão mais perdidos que cachorro caído de mudança – o que não é nenhuma fantasia: não passam de seres caídos do bonde da História. Andam pelas ruas atrás de bagulhinhos em lojas que antes eram de R$0,99, que depois passaram para R$1,99 e que agora já têm preços variados chegando até R$10,00, o que mostra que a bandidagem prossegue engambelando a plebe rude e ignara. Enter.
Triste, mas verdadeiro: o Cristo está esquecido porque soterrado pela interminável avalanche de matéria fecal da mídia, desde o som miserável e desgraçante que se ouve por todo lado, incluindo patéticas duplas de obesos cantando horrores banais ou seres abissais entoando misérias sonoras regressivas e patogênicas, tudo visando destruir qualquer possibilidade de contemplação de alguma beleza e algum crescimento espiritual. Na manjedoura dos presépios das elites está não o Menino Jesus, mas Mefistófeles, o demônio enganador, travestido em criança inocente. Nos lares está não o Cristo renascido, mas a rede Globo despejando podridão e miséria em lindas e bem produzidas imagens, especialmente se transmitidas para a ceia de Satanás, ente maligno vitorioso no espaço dos lares que ainda têm pendurada em paredes a imagem do Cristo crucificado ou Seu semblante em quadros ou gravuras. Na consoada, a TV ligada é a janela para a perda, a fuga, o dissipar-se dos conteúdos sagrados: o artefato maligno desvia as mentes delas mesmas, rouba os pensamentos e o direito a usá-los como instrumentos de progresso e aperfeiçoamento. A TV está ligada, as mentes entram em ponto morto. E Jesus Menino vai sendo enxotado dos lares pela boca aberta de latrina do vídeo depravador, êmulo da conversão obscena do homem à reles matéria passageira e enganadora. Enter.
Na noite de véspera de Natal, nada de tradições: a família está unida apenas pela matéria e pelos interesses inter pessoais. Ninguém pára pelo nascimento do Salvador, ninguém reflete no significado sagrado e místico do Natal: a vitrola toca axé ou sertanojo, as pessoas comem e bebem falando de matéria e de conquistas materiais, falam do carro novo, da nova amante, do novo amante, da viagem à Europa, coisas do gênero. As elites são sempre imundas de alguma forma. Já nos lares pobres, resta a conversão ao deus da TV, todos sem assunto se curvam à telinha ou mesmo telona – cresce o número de TVs de 29 polegadas em barracos de periferia – e da mesma forma o Cristo Menino está postergado, preterido e devidamente esquecido. O Natal virou festa da matéria. Sob os viadutos, lá está o Cristo consolando. Também nos presídios e nosocômios. E assim temos o Natal de hoje, em que os corações empedernidos e embrutecidos se entregam ao fatalismo do mercado e se apresentam como soldados obedientes às ordens da TV. O cidadão comum brasileiro hoje é um infeliz sem alternativa ou perspectiva: é um bovino mugente ou ovino balante. Só. Exceções de praxe, claro. Enter.
A desastrosa e já bem esquecida cantora Simone cantou canções de Natal pra ver se reaquecia algum público e faturava algum. E gravou uma versão boçalíssima de Noite Feliz, calcando no e aberto, patético, ridículo. Também gravou uma versão besta da feia canção de Natal do Lennon, que não vendeu simplesmente nada. Eis o Natal de mercado, em que a data sagrada é usada para que artistas de meia tigela faturem algum, embora completamente distantes do espírito natalino e cristão. O espírito que dirige essa gentuça ignara e grosseira é o dos vendilhões que o Cristo açoitou no templo. Só pensam em usar o Natal para lançar mais dinheiro em suas burras, e são insaciáveis, esses pobres seres sem qualquer norte que não os miseráveis desejos. E jamais aprenderão, a menos que Deus intervenha! Enter final.
Nas portas das quase desertas lojas, sempre um som deletério, axé, pagode, breganojo, que os proprietários consideram que possa "atrair" os bestiais seres ou objetos vestidos que vagam como zumbis pelas ruas caudalosas de tanto fluxo de burrice e insatisfação. Nenhum som natalino se ouve pelas ruas e lojas: sinal de que o Cristo foi banido desses antros de avidez e culto à matéria. O desespero é total: vendedoras desesperadas por vender que atacam o possível freguês com um dúbio "Posso ajudar?" quando na verdade pedem desesperadamente que compremos para que assim as ajudemos. Já os consumidores só fazem dar vazão a seus instintos vulgares de aquisição sem objetivo outro que adquirir, e as lojas são um cenário de desarmonia em todos os sentidos, todos ansiosos e insatisfeitos, e a frustração é o que reina nesse ambiente que só faz a alegria dos demônios globalizadores - cuja vitória maior é vencer o Cristo e promover o deus mercado. A feiúra reina absoluta neste Natal minúsculo e sem Cristo no ar. É bisonho, desolador. E viva Santo Expedito! Oremos. Feliz Natal, gente!