quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Carnaval 2008: a estupidez em festa

Frederico Mendonça de Oliveira, Fredera


Quem pensa em Carnaval nestes dias de retrocesso histórico vertiginoso é no mínimo um pateta ou um desmiolado de quatro costados. Ou alguém que é mais para algo que para alguém mesmo. Os que hoje se interessam por Carnaval são algo classificável como os macacos sem rabo de que falou Ruy Castro em seu Tempestade de Ritmos, livro aliás imperdível por sua demonstração clara da decadência irreversível da arte popular a partir dos valores do século XX. Mas desde décadas até agora, neste já de todo descaracterizado tríduo momesco de 2008, ninguém ousou dizer ou alcançou entender o porquê desse fenômeno de esvaziamento da mais popular e unânime festa popular brasileira: alguns se regozijam com o refluxo do movimento que os incomodava outrora; outros ficam com cara de vaca perdida sem entender por que não ocorre mais o movimento de anos antes; outros apenas seguem bovinamente a procissão tocada pela mídia, querem ir à Marquês de Sapucaí para conviver o maior Carnaval do mundo, com aquele cacetérrimo desfile de escolas de samba todas iguais e com um samba que não muda do início ao fim, com raras exceções para inovações do Salgueiro ou do Império Serrano, se muito; outros esperam o Carnaval para faturar algum a mais, coisa hoje muitíssimo relativa; outros, para se beneficiar da possibilidade de praticar crimes em maior escala, aproveitando o auê geral - e por aí afora. Mas o pulo do gato para entender o porquê do refluxo da alegria social, isso ficou sem uma explicação lógica até agora. Então vamos a isso. Enter.
Primeiro, o Carnaval perdeu completamente seu sentido a partir do declínio da importância da igreja católica. Nos tempos que antecederam o neoliberalismo, mesmo que já sendo bombardeados pela TV, que ao longo de décadas veio estupidificando a população brasileiro de forma irreversível, o Carnaval estava inserido no e dependia do calendário católico, sendo o tríduo de folia consentida, que consistia em festejos populares e em manifestações sincréticas oriundas de ritos e costumes pagãos, como as festas dionisíacas, as saturnais, as lupercais, e se caracterizava pela alegria desabrida, pela eliminação da repressão e da censura, pela liberdade para atitudes críticas e eróticas. Era a liberação para uma espécie de descarga de instintos animalescos reprimidos durante todo o ano pelo respeito aos ditames da Igreja. Se a macacada fazia às escondidas sempre tudo, no Carnaval era lícito manifestar, explicitar isso. Na quarta-feira o bicho pegava, e a tristeza invadia os corações que viveram três dias de liberação. Mas a volta à disciplina religiosa era fato, e a polícia prendia os eventuais blocos que tentavam sair na quarta-feira. Segundo, isso era ainda a cultura cristão-católica, era também cultura pura e simples, pelo fato de gerar atividades várias além da liberação de costumes: formou-se toda uma arte em torno da festa pagã, vindo isso desaguar no rico e variado universo do samba, da machinha de salão, das fantasias, até de uma literatura e uma poesia especiais, sem contar a abordagem da música popular não carnavalesca SOBRE o Carnaval – coisas, só pra citar duas delas, como Marcha da Quarta-Feira de Cinzas, de Carlos Lyra e Vinícius de Moraes, ou A Felicidade, de Tom e Vinícius. E olhem que falo apenas de referências cariocas, sem bater ainda em carnavais outros, como o da Bahia, o de Pernambuco, o do Maranhão, etc. Portanto, até um boneco de Olinda entende que sem cultura e sem o fundamento cristão-católico o Carnaval perde sua essência e sua razão de ser. E os evangélicos, que se multiplicam como coelhos enquanto a Igreja de Paulo encolhe e não seguem o calendário cristão-católico, jogam sem querer a pá de cal no Carnaval. Enter.
E já que fomos estraçalhados em simplesmente TODOS os nossos valores, também o Carnaval foi estraçalhado. Até mesmo porque a patologia infernal da índole dos globalizadores promoveu, para desaculturar o Brasil quanto a costumes, o carnaval temporão, para que se consolide a lei do nada cultural que já se perpetua nas "mentes" dos objetos vestidos que vegetam no Brizêu neoliberalizado, a "festa pela festa", para pulverizar qualquer vestígio de uma cultura baseada nas festas em louvor a santos católicos – ou de outras religiões, como o candomblé. Nestes turvos dias que antecedem o despedaçamento final da civilização, a festa virou apenas promoção de encontros para troca de interesses de toda sorte, para libar por libar, para buscar cegamente o prazer, a coisa unicamente pela coisa. Enter final.
E como as ruas não são mais do povo, a quem apenas se permite que as entulhe sem rumo querendo comprar sem saber o quê – e para isso inventaram o R$ 0,99, depois R$ 1, 99 –, e como o sentido do social histórico e religioso está sepultado pela ditadura dos meios de comunicação, e como ao povo cabe apenas um sofrer sem sentido, sem objetivo, eis que tudo se acaba, inclusive a alegria carnavalesca, que hoje ainda resiste em redutos mesmo que deformada em profundidade, mas tudo se acaba, sim. E de forma patética, senão pífia ou ridícula. Parabéns ao globalizadores: eles sempre visaram destruir os povos, e conosco já conseguiram. Mostraram que são gente dos diabos. Aos diabos eles, pois. E viva Santo Expedito! Oremos. Bye, babes!
Pickles
1 - O episódio do impedimento judicial do carro da Viradouro sobre o Holocausto mostrou o quão ignorante é a turma de hoje: o carnavalesco nem sabe o que pensa ou faz, tenta adular congêneres das vítimas do Holocausto, aliás hoje negado por Armadinejá e outras feras mundo afora – coisa que o carnavalesco ignora ou faz que nem está aí –, leva um impedimento pelas fuças e chora em público por ter perdido essa "oportunidade". Vá estudar História recente, cara!
2 – Esse negócio de mestiças de afrodescendentes com brancos sambando nuas em carros alegóricos já ficou mais corriqueiro e sem impacto que risco de o Corinthians cair pra segunda divisão. A falta de imaginação é a moeda corrente na anti cultura imposta pelos demônios globalizadores. E a plebe ignara chafurda nisso indefesa. Como será o fim do Brasil, hem? Ou já estamos nele e não nos tocamos? Parabéns, globalizadores! Vocês FAZEM mesmo!

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